O STA emite a 6 de dezembro de
2011 um acórdão interposto pela sociedade comercial A e por B e C, um casal de
professores. Depois de o pedido ter sido julgado improcedente e absolvido o réu
por acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra em 2009 em primeira
instância, posteriormente, a mesma solução foi dada pelo Tribunal Central
Administrativo do Norte em segunda instância, em 2010. Inconformados com a
decisão, recorrem ao Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artigo 150º
do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Segundo o artigo, é
admitida revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa
a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se
revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja
claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.” O recurso foi
então admitido por acórdão a 2 de dezembro de 2010.
Os recorrentes formularam as seguintes
alegações.
1.
De acordo com o artigo 71º do Estatuto da
Carreira Docente, “a autorização de destacamento, requisição, comissão de
serviço e transferência de docentes é concedida por despacho do membro do
Governo responsável pela área da educação”. Confere a competência
exclusivamente ao Ministro da Educação. Sendo assim, a competência para decidir
as propostas de requisição dos docentes seria indelegável. O despacho da
delegação teria de fazer referência ao preceito legal, nomeadamente ao Estatuto
da Carreira Docente. Foi emitido um despacho nº 11 529/2005 (2ª Série) de
23/5/2005, onde a S. E. Ministra da Educação delegava competências no Sr.
Secretário de Estado da Educação, mas não fazia referência ao preceito legal e,
para além do mais, alegam que os Secretários de Estado não têm competência
própria, baseando-se no artigo 9º nº1 do DL nº 79/2005, de 15 de abril, exceto
no que se refere aos respetivos gabinetes. A delegação seria então ilegal, pelo
que o ato administrativo praticado pelo Sr. Diretor Regional Adjunto da Direção
Regional de Educação do Centro padecia do vício de incompetência, violando o
artigo 71º do Estatuto da Carreira Docente, o artigo 99º nº1 do DL nº 79/2005 e
os artigos 44º e 45º do Código do Procedimento Administrativo.
2.
O tribunal considerou substituir o vício de
falta de audiência prévia dos interessados, tendo sido violado o artigo 100º do
Código do Procedimento Administrativo.
De facto, tendo em conta as
alegações, a entidade recorrida conclui que não estariam verificados os
pressupostos que sustentam a intervenção excecional do Supremo Tribunal
Administrativo. Efetivamente, a matéria da competência do Diretor
Regional-Adjunto exorbita o âmbito de cognição do Tribunal Central
Administrativo Norte e por isso, deveria ficar separada da cognição do Supremo.
No entanto, quanto à questão da
legitimidade do Diretor Regional Adjunto, o Tribunal encontra sustento no CPA,
mas além disso, no despacho nº 11530/2005 da Ministra da Educação e nos
despachos nº 16796/2000 e 25307/2005 da Diretora Regional de Educação do
Centro.
Relativamente à questão da
audiência prévia, esta não tem caráter invalidante quando se verifique que a
Administração não viria a tomar outra decisão que não a decisão tomada, sendo
este o caso.
Admitido o recuso interposto nos
termos do artigo 150º do Código do Procedimento nos Tribunais Administrativos, o
Supremo Tribunal Administrativo admite a revista excecional, “para determinar o
sentido e alcance da proibição contida no artigo 32º do DL n.º 553/80, de
21/11, esclarecendo se a mesma se aplica à entidade instituidora de uma escola
particular que formulou ao Ministério da Educação pedido de mobilidade para que
dois dos seus docentes possam prestar serviço na dita escola.”
Começando por conhecer do vício
da incompetência, os recorrentes alegam que o ato impugnado sofre do vício da
incompetência porque a requisição dos docentes é da competência exclusiva do
Ministro da Educação, como estatui o artigo 71º do Estatuto da Carreira
Docente, e porque o despacho da delegação não faz referência ao preceito legal.
Alegam ainda que esta competência é indelegável, por se tratar de competência
exclusiva.
O Supremo, por outro lado,
entende que o artigo 71º do Estatuto da Carreira Docente não foi violado e
consequentemente, que não há vício da competência.
No acórdão, o STA define
competência como o “complexo de poderes funcionais conferido por lei a cada
órgão para o desempenho das atribuições da pessoa coletiva em que esteja
integrado”. A competência não se presume, ela tem de ser atribuída por lei. É
isto que resulta do princípio da legalidade da competência. Segundo o professor
Freitas do Amaral, a competência é própria quando os poderes exercidos por um órgão
são poderes cuja titularidade pertence a esse mesmo órgão e será competência
delegada quando o órgão administrativo exerce uma parte da competência de outro
órgão, cujo exercício lhe foi transferido por lei. Efetivamente, o Ministro da
Educação tem uma competência própria, pois o artigo 71º nº1 do ECD concede-lhe
a competência para autorizar o destacamento de docentes. De facto, esta
competência é originária, pois é adquirida por lei, sem precisar da intervenção
de outro órgão, contrariamente à competência derivada, que é delegada pelo
órgão a que a lei originalmente tinha reconhecido.
Por sua vez, a competência
exclusiva existe quando a competência do subordinado não se inclui na
competência do superior hierárquico.
Tendo por base estas definições,
o Supremo considera que os recorrentes confundiram competência própria com
competência exclusiva, pois entendem que se estando perante uma competência
originária e própria, esta só pode ser exercida pelo próprio Ministro da
Educação. De facto, nos termos do artigo 44º nº1 do CPA “os órgãos
administrativos normalmente competentes para decidir em determinada matéria
podem, sempre que para tal estejam habilitados por lei, permitir, através de um
ato de delegação de poderes, que outro órgão ou agente pratique atos
administrativos sobre a mesma matéria”. Concluindo, regra geral, os órgãos
podem delegar competência noutros órgãos ou agentes, salvo as exceções do
artigo 45º do CPA, que não se verificam no caso.
Quanto aos despachos em que a
Sra. Ministra da Educação delegou competências no Sr. Secretário de Estado da
Educação, o Supremo reconhece que não fazem referência ao Estatuto da Carreira
Docente. No entanto, a lei habilitante para este caso é o artigo 9º nº1 do DL
nº79/2005. A Lei Orgânica do XVII Governo Constitucional permite aos
secretários de Estado e o subsecretário de Estado que não dispõem de
competência própria, exceto no que se refere aos respetivos gabinetes, que
“exercem, em cada caso, a competência que neles seja delegada pelo
Primeiro-Ministro ou pelo ministro respetivo, com possibilidade de conferir
poderes de subdelegação.” Esta lei habilitante é mencionada no despacho
ministerial e, portanto, o Supremo conclui que não se verifica o vício da
incompetência.
Quanto à segunda alegação,
defendem os recorrentes a violação do artigo 100º do CPA, referente à audição
dos interessados. Efetivamente, o artigo impõe a audição dos interessados, após
a conclusão da instrução e antes de ser tomada a decisão final. Em ambas as
instâncias foi dada como provada a preterição da audiência dos interessados,
mas foi acordado que não haveria nenhuma repercussão para a decisão tomada.
Tendo por base o princípio do aproveitamento do ato administrativo, em caso de
anulação do ato, a Administração praticaria forçosamente outro ato com o mesmo
conteúdo do primeiro. Estar-se-ia perante uma atividade vinculada da
Administração. No entanto, o Supremo entende que não é o caso dos autos.
Tendo em conta os preceitos dos
artigos 64º nº1, 67º nº1 e nº2 alínea c) do ECD, pode-se concluir que poderia
haver outros interesses a ponderar para a requisição de um docente.
Efetivamente, o despacho para a requisição de docentes tem natureza
discricionária, pois podem ser ponderados muitos outros elementos para a
requisição dos mesmos, levando à escolha da melhor decisão.
O Supremo entende que a violação
do artigo 100º do CPA não pode ser considerada uma mera irregularidade, pois
impunha-se a audição dos interessados, onde estes podiam ter exposto as suas
razões no sentido do deferimento dos seus pedidos.
A Administração poderá ser
condenada à prática de outro ato que teria de ser precedido da necessária
audiência prévia dos interessados. Nos termos do artigo 173º do CPTA, a
Administração seria obrigada a praticar um novo ato, sendo que este poderia ser
igual ao anterior, mas teriam de ser expurgados os vícios detetados. No
entanto, a requisição seria para o ano 2005/2006, o que implica que já não
seria possível proceder a um novo ato de requisição para esse ano. Como solução
alternativa, poderá proceder-se à modificação objetiva da instância, nos termos
do artigo 45º do CPTA.
Finalizando, é revogado o acórdão
recorrido, anula-se o ato impugnado, por estar verificada a falta de audiência
prévia e devem os autos baixar à primeira instância para prosseguir à modificação
objetiva da instância, nos termos do artigo 45º nº1 do CPTA. Considero a
solução dada como razoável e conforme ao Direito.
Bibliografia:
DIOGO FREITAS DO AMARAL, «Curso
de Direito Administrativo», volume 1, 4º Edição, Almedina, Coimbra, 2016.
Daniela Silva
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