Monday, May 28, 2018

Indeferimento tácito

Comentário a um acórdão sobre a evolução da jurisprudência relativamente ao ato de indeferimento tácito

A evolução do Direito Administrativo ao longo das várias épocas, teve como uma das grandes consequências, a mudança no modo de atuação da Administração Pública. Numa perspetiva mais ampla, a Administração deixa de atuar apenas de forma autoritária em matérias circunscritas (no que diz respeito à preservação do direito de propriedade e garantia à liberdade e segurança), para passar também a prestar serviços, devido ao crescimento das suas atribuições, nomeadamente em matérias de questões sociais e económicas.
Esta mudança no paradigma de atuação administrativa é relevante para entender um fenómeno característico da época do ato polícia, modo de atuação caraterístico da Administração agressiva da época liberal. O ato de indeferimento tácito verifica-se sempre que, no decorrer de um procedimento administrativo, a Administração Pública não se pronuncia sobre uma questão que foi colocada por uma das partes do procedimento. A lei em vigor na altura considerava que, perante a omissão da Administração relativamente a uma pretensão formulada por um particular, o pedido feito teria sido indeferido tacitamente.
Todo este paradigma vem ser alterado com a implementação dos princípios procedimentais que foram consagrados na nova versão do Código de Procedimento Administrativo. Para esta questão específica do ato de indeferimento tácito, vem o princípio da decisão, consagrado no art.13º CPA, afastar esta possibilidade que a Administração tinha. O princípio da decisão vem implementar à Administração um dever de conduta, nomeadamente o dever legal de decidir. Esta regra estabelece que perante um pedido elaborado pelos particulares, a Administração tem o dever de exercer os seus poderes, pronunciando a sua decisão. Com o fundamento
Porém este dever de decisão apresenta as suas limitações, visto que não é um dever absoluto. O art.13º/2 estabelece que, passados dois anos após a resposta apresentada pelo órgão administrativo, considera-se que a questão colocada pelo particular foi bem respondida, extinguindo-se o dever de legal de decidir naquele caso concreto. A ratio por detrás deste prazo é a criação de uma medida que impeça que os particulares estejam constantemente a pedir esclarecimentos sobre questões que já foram devidamente respondidas, tendo como consequência o aumento injustificado das tarefas do órgão administrativo. Apesar do que foi anteriormente referido, renasce esta possibilidade de esclarecimento se, no caso em questão se verificar uma alteração das circunstâncias. Existindo uma alteração das circunstâncias da situação em causa ou do direito, volta a existir um dever de decisão da Administração que se contrapõe ao direito de resposta do interessado. Cabe ainda referir que, mediante uma resposta cabal por parte da Administração, finda o direito de resposta que o particular possui. Isto não impede as garantias que administrativas que estão à disposição do particular, como a impugnação e a faculdade de reclamação.
Um dos vários exemplos deste fenómeno é o acórdão de 28 outubro de 2009, processo 0595/09 do Supremo Tribunal Administrativo. O caso em questão é relativo a um recurso apresentado por um particular, que pretende a impugnação de um ato de indeferimento tácito por parte de uma Fazenda Pública, que na realidade não é mais do que uma ficção jurídica. Concretamente, mediante uma liquidação adicional do IRS, o particular procedeu à apresentação de uma reclamação, porém nenhuma decisão foi proferida. Sem entrar em aprofundamentos sobre questões técnicas de matéria processual, a decisão do tribunal foi no sentido de impugnar o ato de liquidação, que foi o ato que gerou a reclamação que não recebeu resposta.
Uma das críticas apresentadas ao legislador, no que diz respeito à medida implementada, é relativa ao facto de este não ter afastado simultaneamente o ato de deferimento tácito. À primeira vista, a perceção que se transpõe é a de que o ato de deferimento tácito é um benefício para os particulares, na medida que, em caso de omissão por parte da Administração Pública, é considerado que existe um despacho favorável. Porém, na verdade, o que se verifica é apenas uma não atuação da Administração. Portanto, se não existe realmente um ato, não há a concessão de direitos aos particulares.   


Álison Costa nº56943

Saturday, May 26, 2018

Publicação Extra

       O Ato Administrativo
         Podemos definir o ato administrativo como o ato jurídico unilateral praticado, no exercício do poder administrativo, por um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei, e que traduz a decisão de uma caso considerado pela Administração, visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta. O conceito de ato administrativo está regulado atualmente no artigo 148º do CPA.
          O ato administrativo é então, um:
·                         - Ato jurídico, ou seja, uma conduta voluntária produtora de efeitos jurídicos;
·                  -  Ato unilateral, ou seja, um ato jurídico que provém de um só autor, independentemente do concurso de vontades de outros órgãos ou sujeitos de direito;
·                       -  Ato praticado por um órgão administrativo, através de um poder que lhes é conferido por lei ou que lhes é conferido mediante delegação de poderes. Se um individuo sem qualquer vínculo com a Administração se faz passar por órgão desta e pretende praticar atos administrativos, tais atos não valem como atos administrativos, são inexistentes e, consequentemente, não produzem quaisquer efeitos jurídicos, bem como pratica, o autor desse tipo de atos, o crime de usurpação de funções, ficando sujeito a responsabilidade penal e responsabilidade civil, nos termos gerais de direito, cabendo-lhe indemnizar todos os prejuízos que por esse facto tiver causado a outrem;
·                         -  Ato decisório;
·                         - Ato produtor de efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
      Os Atos Administrativos podem ser ainda, atos colectivos (atos que têm por destinatário um conjunto verificado de pessoas), atos plurais (são aqueles em que a Administração Pública toma uma decisão aplicável por igual a várias pessoas diferentes) ou atos gerais (são aqueles que se aplicam de imediato a um grupo inorgânico de cidadãos, todos bem determinados, ou determináveis no local).
       Segundo o Professor Freitas Do Amaral, o ato administrativo deve ser encarado como possuindo natureza própria e caracter específico, enquanto ato unilateral de autoridade pública ao serviço de um fim administrativo.
       Podemos concluir então, relativamente à sua natureza que o regime do ato administrativo é o que consta da lei e da jurisprudência administrativa, e deve corresponder, por via de regra, à natureza sui generis do ato administrativo. Se outra coisa não resultar da sua natureza específica de atos administrativos, podem aplicar-se supletivamente aos atos predominantemente discricionários as regras próprias do negócio jurídico como ato intencional indeterminado e aos atos predominantemente vinculados, as regras próprias da sentença como ato de aplicação de norma geral e abstracta a uma situação individual e concreta.
      Relativamente ao poder discricionário da Administração importa referir que não existem atos totalmente vinculados, nem totalmente discricionários, Hoje, o poder discricionário não é um poder inato, é um poder derivado da lei. Para além de só existir com fundamento na lei, o poder discricionário só pode ser exercido por aqueles a quem a lei o atribuir, só pode ser exercido para o fim que a lei lhe confere e deve ser exercido de acordo com certos princípios jurídicos de atuação. O poder discricionário está sujeito a controlos de legalidade (visam determinar se a Administração respeitou ou violou a lei), controlos de mérito (aqueles que visam avaliar o bem fundado da decisão da Administração, independentemente da sua legalidade), controlos jurisdicionais (aqueles que se efectuam através dos tribunais) e por fim, controlos administrativos (são realizados por órgãos da Administração).
      A estrutura do ato administrativo compõe-se de quatro ordens de elementos:
·            - Elementos subjetivos- O ato administrativo típico põe em relação dois sujeitos de direito, a Administração pública e um particular. Os dois sujeitos de direito são normalmente duas pessoas coletivas públicas, mas pode dar-se o caso de duas pessoas coletivas privadas.
·                 - Elementos formais- Todo o ato administrativo tem sempre necessariamente uma forma, isto é, um modo pelo qual se exterioriza ou manifesta a decisão voluntária em que o ato consiste. Durante o procedimento administrativo, presente no artigo 53º e seguintes do CPA, encontramos ainda, as formalidades, que correspondem aos trâmites que a lei manda observar com vista a garantir a correta formação da decisão administrativa à luz do interesse público, bem como o respeito pelos direitos subjetivos e interesses legítimos dos particulares;
·                 - Elementos objetivos- Os elementos objetivos do ato administrativo são o conteúdo e o objeto;
·                - Elementos funcionais- Finalmente, o ato administrativo comporta três elementos funcionais, entre eles, a causa, os motivos e o fim. A causa refere-se, por um lado, à função jurídico-social de cada tipo de ato administrativo e, por outro lado, ao motivo típico imediato de cada ato administrativo. Os motivos, por sua vez, são todas as razões de agir que impelem o órgão da Administração a praticar um certo ato administrativo ou a dotá-lo de um determinado conteúdo. Quanto ao fim, trata-se do objectivo ou finalidade a prosseguir através da prática do ato administrativo. Há que distinguir aqui entre o fim legal, ou seja, o fim visado pela lei na atribuição de certa competência a um dado órgão da Administração e o fim efetivo, ou seja, o fim real, aquele que tenha sido prosseguido de facto pelo órgão administrativo num dado caso.


         Bibliografia
        - FREITAS DO AMARAL, Diogo, Curso de Direito Administrativo, Vol II, 2ª ed., 2011, Almedina

       Maria Margarida Testos, nº27798

Friday, May 18, 2018

SIMULAÇÃO - GRUPO DOS CASOS ESPECIAIS

https://1drv.ms/w/s!AjH7mwYkgqzHgTVpdXvd9-LubXrv


Trabalho realizado por:
Beatriz Fernandes nº57054
Carolina Rato nº56795
Cláudia Monteiro nº57271
Christian Ghitu nº56856
Margarida Veiga nº27798
Tiago Rodrigues nº57337

SIMULAÇÃO - GRUPO DO GOVERNO


https://1drv.ms/w/s!AkvOF459EuwIilBgVdfNPAcP2KJ-

António Baltasar Mendes 57072
Alexandre Gil
Mariana Vieira 56757
Maria Ana Bau 56737
Klerlie Santos 57100
Rita Patrício 56701
Catarina Mina

SIMULAÇÃO - GRUPO DO SINDICATO

https://1drv.ms/w/s!AkvOF459EuwIik5d6XDTDCjyHD91

2º Turma B Subturma 14
Álison Costa 56943
Beatriz Oliveira 56768
Catarina Cruz 56960
Daniela Lopes da Silva 57095
Mafalda Saraiva 56931
Maria Helena Abreu 57008
Maria João Ferreira 56804
Neuza Carreira 57098
Pedro Conceição 56884
Ricardo Ferreira 57016

Wednesday, May 9, 2018

Análise e comentário ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo – processo 0287/17 de 26 de abril de 2018 (Publicação Extra)


Resumo do Acórdão

O Sindicato dos Trabalhadores representa o requerente, seu associado, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada (TAFA), numa ação administrativa especial para impugnação de ato contra o Município de Setúbal. O requerente procura a declaração de nulidade ou anulabilidade do ato impugnado - despacho da Vereadora, com competência delegada da Câmara Municipal de Setúbal, que homologou a lista unitária de ordenação final do procedimento concursal comum de recrutamento para a carreira geral e categoria de assistente operacional (área de limpeza de espaços públicos) bem como do procedimento concursal, no segmento relativo à aplicação do método de seleção da entrevista profissional; Tal como, procura ainda, a condenação da entidade demandada a determinar e proceder à expurgação de todos os vícios e irregularidades do procedimento concursal, repetindo o mesmo.
Assim, o requerente defende que não estão devidamente fundadas as entrevistas profissionais de seleção, visto que os níveis classificativos do desempenho não permitem encontrar a justificação para a atribuição de classificações numéricas diferenciadas aos candidatos. Tal ocorre, pois, o júri limitou-se a informar quais as classificações que iria atribuir e os valores que lhes correspondiam, sem que tenha indicado os critérios diferenciadores de tais notas. De tal modo, requere a nulidade ou anulabilidade do ato.
Consequentemente, requere, então, a reconstituição da situação e reposição da legalidade concursal, sendo necessário fundamentar a notação da entrevista do candidato demandante, e de todas as demais entrevistas profissionais de seleção realizadas aos candidatos que ficaram graduados à frente do mesmo e que vieram a ser providos em face da ordenação definida pela lista de classificação e ordenação anulada.
Decisões: TAFA decidiu a favor do requerente, devendo o Município anular ato da vereadora e proceder a novas entrevistas. Após recorrer para Tribunal Central Administrativo Sul, onde ação foi dada como improcedente, o réu colocou recurso para o Supremo Tribunal Administrativo que veio a concordar com as anteriores decisões e declarou todas as custas a favor do réu, o Município de Setúbal.



Matérias Relacionadas

Com este acórdão relacionam-se, então, as matérias da eficácia do ato administrativo, da invalidade, ilegalidade e dos vícios do ato administrativo, mais concretamente, o vício de forma, nomeadamente, a falta de fundamentação do ato administrativo – pretermite legal da atuação administrativa.
Viola-se dever de fundamentação dos atos administrativos, constituindo tal um vício de forma, produtor de anulabilidade do ato impugnado.

Requisitos de eficácia do ato administrativo

Primeiramente é necessário esclarecer que a eficácia consiste na efetiva produção de efeitos jurídicos pelo ato, a projeção na realidade da vida dos efeitos jurídicos que integram o conteúdo de um ato administrativo. Para o ato ser eficaz tem de cumprir todos os requisitos de eficácia exigidos pela lei.
A ineficácia, pelo contrário, é o fenómeno da não-produção de efeitos jurídicos num dado momento.
Os requisitos consistem nas exigências que a lei faz para que um ato administrativo, uma vez praticado, possa produzir os seus efeitos jurídicos.
- Devido ao princípio do imediatismo dos efeitos jurídicos, o ato produz efeitos desde o momento da sua prática (art.155º/1). 
- Exceções no art.156º e 157º. 
- Exige sempre a notificação e/ou a publicação – art.158º a 160º


Invalidade

A invalidade é um valor jurídico negativo que afeta o ato administrativo em virtude da sua inaptidão intrínseca para a produção dos efeitos jurídicos que devia produzir.
Dentro da invalidade, podemos identificar diversas fontes:


1)     Ilegalidade
     
A legalidade é a principal fonte de invalidade, incluindo a CRP, a lei ordinária, os regulamentos, os contratos administrativos, os atos administrativos constitutivos de direitos, entre outros, constituindo, então, o blogo da legalidade. Ocorre quanto o ato é contrário à lei, podendo assumir várias formas, dentre as quais, os vícios do ato administrativo.


- Os vícios do ato administrativo

Os vícios do ato administrativo são as formas específicas que a ilegalidade do ato administrativo pode revestir.
            Há quem entenda que com a CRP de 1976 deixou de ser exigível por lei que os particulares, ao recorrerem contenciosamente de qualquer ato administrativo, discriminem qual o vício que enferma o ato. Apoiam-se no art.268.º, nº4 da CRP.
Para o Prof. Diogo Freitas do Amaral, este preceito não quis inconstitucionalizar todas as disposições da lei ordinária que, em sede de contencioso administrativo, exigem a especificação do vício do ato recorrido. Tal especificação é útil em termos de clareza e celeridade processual.
Os vícios englobam o vício de forma, a usurpação de poder, a incompetência, a violação de lei, o desvio de poder e a cumulação de vícios.

- O vício de forma

O vício de forma é o vício que consiste na preterição de formalidades essenciais ou na prática de forma legal. Comporta três modalidades:
- Preterição de formalidades anteriores à prática do ato – falta de audiência prévia dos interessados.
- Preterição de formalidades relativas à prática do ato – regras de votação dos órgãos colegiais.
- Forma legal – prática, por despacho, de atos que a lei exija forma de decreto.
A eventual preterição de formalidades posteriores à prática do ato administrativo não produz ilegalidade (nem invalidade), apenas produz a ineficácia. Tal ocorre porque a validade de um ato administrativo se afere sempre pela conformidade desse ato com o ordenamento jurídico no momento em que ele é praticado. Portanto, no momento em que um ato administrativo é praticado, pode ser inválido, por estar em contradição com a lei. Mas, se a preterição das formalidades ocorrer depois de o ato ser praticado, o ato não fica inválido, não há repercussão para trás. O que ocorre depois da prática do ato não o invalida.
Portanto, se a Administração pretender executar o ato sem este ter recebido visto do Tribunal Constitucional, o ato não se torna inválido, é apenas ineficaz enquanto não tiver visto (art.129.º, alínea c) do CPA). Não é o ato que se torna ilegal, mas sim a sua execução, pois é contrário à lei executar um ato ineficaz (art.149.º, nº1 e 150.º, nº1, alínea c) do CPA).


A obrigação de fundamentar

A fundamentação é a enunciação explícita das razões que levaram o seu autor a praticar determinado ato ou a dotá-lo de certo conteúdo (art.124.º a 126.º do CPA).
No art.124º do CPA prevê-se a obrigação de fundamentação, sendo esta uma formalidade de grande importância, não apenas para o particular lesado pela atuação administrativa, como também, na perspetiva do tribunal competente, para ajuizar da validade do ato e na perspetiva do interesse público.
Para o autor, Rui Machete, o dever de fundamentação tem quatro funções:
- Defesa do particular
- Autocontrolo da Administração.
- Pacificação das relações entre administração e particulares.
- Clarificação e prova dos factos sobre os quais assenta a decisão.

O objetivo essencial trata de esclarecer concretamente a motivação do ato, permitir a reconstituição do pensamento e razão que determinou a adoção de um ato com determinado conteúdo (art.125.º, nº2 CPA).

Pode existir, porém, dispensa de fundamentação, prevista no art.124.º, nº2, alíneas a) e b) do CPA.
            No caso da alínea a), a justificação da dispensa de fundamentação reside na natureza específica do ato de homologação, que incorpora e absorve o ato homologado: como este tem de ser fundamentado, a homologação apropria-se da fundamentação e torna-se, desse modo, automaticamente fundamentada.
            No caso da alínea b), a fundamentação, a existir, não seria dirigida a terceiros, mas, apenas, ao subalterno; ora, a autoridade hierárquica do superior deve poder ser exercida sem necessidade de dar explicações.

            A fundamentação tem ainda de preencher os requisitos do art.125.º do CPA, tendo de ser expressa, ou seja, enunciada no contexto do próprio ato pela entidade decisória, e de consistir na exposição, ainda que sucinta, dos fundamentos de facto e de direito da decisão.
            De facto, segundo o STA - «Dada a funcionalidade do instituto da fundamentação dos atos administrativos, o fim meramente instrumental que o mesmo prossegue, este ficará assegurado sempre que a decisão em causa se situe inequivocamente num determinado quadro legal, perfeitamente cognoscível do ponto de vista de um destinatário normal»
            Assim, fundamentação tem de ser clara, coerente e completa, não devendo ser contraditória, obscura ou insuficiente. De acordo com o STA, basta que seja suficiente para que seja completa.

           
            Casos especiais

Ainda assim, existem dois casos com regime jurídico especial:
- Quando o ato administrativo consistir numa declaração de concordância com os fundamentos de anterior parecer, informação ou proposta: o dever de fundamentação considera-se cumprido com essa mera declaração de concordância (art.125.º, nº1 do CPA). Havendo homologação, nem sequer é necessário fazer expressamente qualquer declaração de concordância: a homologação absorve automaticamente os fundamentos e conclusões do ato homologado.
- Caso dos atos orais: em regra, não contêm fundamentação - ou são reduzidos a escrito numa ata (onde tem de estar a fundamentação sob pena de ilegalidade) ou, não havendo ata, a lei dá aos interessados o direito de requerer a redução a escrito da fundamentação dos atos orais, cabendo ao órgão competente o dever de satisfazer o pedido em 10 dias (art.126.º, nº1 do CPA). O não exercer da faculdade de requerer fundamentação não prejudica os efeitos da sua falta (art.126.º, nº2 do CPA). Se não houver fundamentação, o particular pode recorrer ao processo judicial de intimação ou pedir recurso de anulação, tendo como causa a falta de fundamentação.


Consequências da falta de fundamentação

Em caso de existir falta de fundamentação, o ato será ilegal por vício de forma e será anulável, segundo o disposto no art.135.º do CPA.
Porém, se um ato vinculado se baseia em dois fundamentos legais e um não se verifica, mas o outro basta para alicerçar a decisão, o tribunal não anula o ato por força do princípio do aproveitamento dos atos administrativos.
Deve ainda expor-se que, onde haja poderes discricionários ou espaços de escolha administrativa, não poderá o juiz aproveitar um ato formalmente viciado, pois não está em condições de declarar aquele conteúdo como a única decisão legítima.


2)     Outras fontes de invalidade

Um ato pode ser inválido e, portanto, nulo ou anulável, por razões que nada têm a ver com a sua ilegalidade (pode ser por motivos comuns ao direito privado como o erro, dolo, coação, simulação e etc.) Nesse caso o ato é ilícito e há pelo menos quatro casos: o ato administrativo não viola a lei, mas ofende um direito subjetivo ou interesse legítimo dum particular; o ato administrativo viola um contrato não administrativo; o ato administrativo ofende a ordem pública ou os bons costumes; o ato administrativo contém uma forma de usura. Também pode haver vícios da vontade se o particular enganar a Administração. A vontade da Administração deve ser sempre livre e esclarecida.



Anulabilidade

 Segundo o estipulado no art.163º/2, um ato é juridicamente eficaz até ao momento em que venha a ser anulado ou suspenso, sendo sanável pelo decurso do tempo, por ratificação, reforma ou conversão, tal como a base legal prevê - art.164º/1), art.136º e art.141º - logo, se não for anulado dentro de um certo prazo, torna-se um ato inatacável.
Porém, se ninguém fizer o pedido de afastamento ou a Administração tomar a iniciativa de os afastar, os atos continuam a produzir efeitos, apesar de serem ilegais, sendo sempre possível ir a tribunal para pedir a verificação da legalidade. Ainda assim, produzirão efeitos até que tal seja efetuado.
O ato anulável é, assim, obrigatório, quer para os funcionários públicos, quer para os particulares, enquanto não for anulado, não sendo possível opor qualquer resistência à execução forçada de um ato anulável. A sentença proferida sobre um ato anulável é uma sentença de anulação, de natureza constitutiva.
Só pode existir impugnação num tribunal administrativo, tendo esta decisão, caso seja tomada, efeitos retroativos, e tudo ocorrendo na ordem jurídica como se o ato nunca tivesse sido praticado.
A regra geral da anulabilidade é o art.163º/1 e, por razões de certeza e de segurança da ordem jurídica, com o tempo o ato fica sanado, fazendo com que deixe de pairar uma dúvida sobre os atos da Administração.
            Segundo o prof. Vasco Pereira da Silva, não há convalidação, podendo o particular continuar a pedir ao Tribunal a restituição dos seus direitos devido ao facto de o ato continuar a ser ilegal – passar o prazo significa que o particular não pode afastar o ato da ordem jurídica, mas, ainda pode pedir sentença em tribunal para que os seus direitos sejam acautelados à luz da ilegalidade desse ato.
A doutrina apresentada provém de Marcello Caetano, onde se equiparava o caso julgado ao caso decidido e se considerava o prazo de impugnação como meramente adjetivo, podendo o particular fazer sempre valer os seus direitos.
            Segundo o CPTA, o ato já não pode ser impugnado porque passou o prazo, mas o particular pode levar o caso a juízo de forma a que se condene a Administração pela ilegalidade do ato.


            Âmbito de aplicação da nulidade e da anulabilidade

            No nosso direito, a nulidade tem carácter excecional, tendo a anulabilidade carácter de regra – como enuncia o art.135.º do CPA. Por razões de certeza e de segurança da ordem jurídica, a regra no Direito Administrativo português consiste em todo o ato administrativo inválido ser anulável.
            Na prática, porém, temos de apurar, acerca de um ato cuja validade estejamos a analisar, se é ou não nulo: porque se o não for, cai na regra geral e é anulável.


Correspondência entre vícios e formas de invalidade

            Não há uma correspondência automática de cada vício a uma certa forma de invalidade, conforme resulta da regra geral constante do art.133.º e 135.º do CPA. Ainda assim, obtém-se:

·        Usurpação do poder: todos os casos se solucionam com nulidade.
·        Incompetência:
-         Por falta de atribuições – nulidade.
-         Por falta de competências – anulabilidade.
·        Vício de forma:
-         Carência absoluta de forma legal: nulidade.
-         Deliberações tomadas tumultuosamente: nulidade.
-         Deliberações tomadas sem quórum: nulidade
-         Deliberações tomadas sem ser pela maioria exigida por lei: nulidade.
-         Deliberações que nomeiem ilegalmente funcionários sem concurso: nulidade.
-         Outros vícios de forma: anulabilidade
·        Violação de lei
-         Casos de violação de lei referidos no art.133.º do CPA: nulidade.
-         Quaisquer outros casos de violação de lei: anulabilidade
·        Desvio de poder: anulabilidade.



Conclusões

            Em suma, com a análise do acórdão supramencionado, denota-se a importância que a fundamentação dos atos tem na atuação administrativa. Para proteção do particular e dos seus interesses, para autolimitar a atuação da Administração, para facilitar as relações entre os particulares e a Administração e ainda clarificar e provar os factos sobre os quais assenta a decisão.
            É de extrema importância que este requisito legal seja cumprido, sob pena de ser ilegal por vício de forma e ter de se incorrer na anulabilidade do ato. Devido ao exposto, concordo com a decisão do Supremo Tribunal Administrativo ao defender a posição do particular e requerer a declaração de anulabilidade do ato da Vereadora com posterior realização de novo concurso, sendo todas as custas a cargo do Município de Setúbal – estão preenchidos os requisitos, nomeadamente, da eficácia retroativa, dos prazos, do recurso para tribunal administrativo, etc.
            Assim, a meu ver, a decisão judicial cumpriu os princípios administrativos, respeitando o Princípio da Legalidade ao fundamentar a sua atuação com os preceitos legais base necessários, o Princípio da Transparência, fundamentando e expondo a argumentação, as suas decisões e interpretações na letra da lei de forma clara e explícita, respeitou o Princípio da Decisão (art.9º do CPA), emanando a decisão final que lhe competia e o Princípio da Participação dos Particulares na formação das decisões que lhes dizem Respeito - art.267.º, n.º5 da CRP e art.8.ºdo CPA – sendo o concurso de grande importância para os particulares – tal como, a decisão foi adequada e justa perante o caso concreto. 


Bibliografia
  
- Rebelo de Sousa, Marcelo e Salgado de Matos, André. 2006. Direito Administrativo Geral: Tomo III. Lisboa, D. Quixote
- Freitas do Amaral, Diogo. Curso de Direito Administrativo: Volume II
- Pereira da Silva, Vasco. O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise




Trabalho realizado por:
Carolina Matroca
Nº 56795 
Subturma 14 – Turma B