O poder discricionário e o poder vinculativo
para gulosos: Tortilla Administrativa
Podemos
definir o poder discricionário como
o “espaço de liberdade da actuação administrativa conferido por lei e limitado
pelo bloco de legalidade”. A lei pode regular uma actuação da Administração
Pública oferecendo-lhe uma permissão
para que ela decida pela opção mais adequada a cada situação. Ao poder de
escolha que terá que corresponder a uma lógica criadora, executora de lei e
respeitadora de princípios constitucionalmente consagrados designamos de poder
discricionário.
Segundo o professor FREITAS DO AMARAL não existem actos exclusivamente discricionários nem exclusivamente vinculados, constatando-se uma mescla entre os mesmos. O poder discricionário não é um poder livre dentro dos limites da lei, mas sim um poder jurídico delimitado pela lei.
No
Direito Administrativo Clássico, a discricionariedade coincidia com a
arbitrariedade. Na realidade, tínhamos uma Administração Pública restrita em
certas áreas e completamente livre nas demais. Tudo apontava para uma ideia de
impossibilidade de controlo do poder discricionário.
O poder discricionário é hoje entendido como
um poder de realização do princípio da legalidade no domínio concreto. O Prof.
VASCO PEREIRA DA SILVA acrescenta que a Administração Pública não tem nunca “uma liberdade”, mas sim uma margem de manobra que é balizada por
critérios legais.
O professor SÉRVULO DE CORREIA
introduz uma dupla dimensão:
Em primeiro lugar, podemos falar de uma margem de livre apreciação e, em segundo lugar, uma margem de livre decisão. Esta dupla dimensão demonstra que a Administração Pública não se preocupa apenas com os resultados finais da sua atuação.
Em primeiro lugar, podemos falar de uma margem de livre apreciação e, em segundo lugar, uma margem de livre decisão. Esta dupla dimensão demonstra que a Administração Pública não se preocupa apenas com os resultados finais da sua atuação.
Para VASCO
PEREIRA DA SILVA, esta denominação é um tanto ou quanto incorrecta, isto porque aquilo que existe é uma margem de escolha, e não uma margem de
liberdade – ou seja, para o Professor temos:
1)
Fase de interpretação (função criadora que implica escolhas);
2)
Margem de apreciação
(dimensão discricionária);
3)
Margem de decisão (escolha
em concreto);
Em
suma, a Administração Pública se tem de basear sempre numa previsão normativa
encontrando os seus critérios decisórios no ordenamento jurídico. A
discricionariedade e a vinculação são duas faces da mesma moeda,
correspondentes a formas de realização do Direito em sentido amplo:
- A
discricionariedade não é ilimitada, é controlada pelo juiz e pelos princípios
de direito. O juiz, tal como o chefe,
nunca chega a controlar o sal ou a pimenta da tortilla, não obstante, controla
o seu excesso, controlando também o cozinheiro, detetando se este usou azeite ao
invés de manteiga, como era indicado na receita.
Em abstrato há sempre, pelo menos, 3
LIMITAÇÕES ao poder discricionário, 3 aspetos vinculados:
1) Competência: a competência dos órgãos é sempre vinculada. Quando um órgão é incompetente há ilegalidade;
2) Finalidade: as competências têm em vista a prossecução de um fim. Não havendo prossecução desse fim, brota o vício da ilegalidade;
3) Princípios Avulsos: tanto os tradicionais, como os Princípios Gerais de Direito Administrativo os quais integram a noção de legalidade e permitem o controlo do seu exercício pela Administração Pública. Princípios nacionais, europeus e internacionais.
1) Competência: a competência dos órgãos é sempre vinculada. Quando um órgão é incompetente há ilegalidade;
2) Finalidade: as competências têm em vista a prossecução de um fim. Não havendo prossecução desse fim, brota o vício da ilegalidade;
3) Princípios Avulsos: tanto os tradicionais, como os Princípios Gerais de Direito Administrativo os quais integram a noção de legalidade e permitem o controlo do seu exercício pela Administração Pública. Princípios nacionais, europeus e internacionais.
Mas como distinguir o poder discricionário do
poder vinculativo? Vamos ao que interessa.
Ingredientes:
6 ovos
100 g Presunto
10 g Azeite
Pão Rústico
Sal e Pimenta
Instruções:
1º Passo: Corte o presunto em Pequenos
cubos:
1.1. Poder discricionário-
Tamanho dos cubos de presunto;
1.2. Poder vinculativo: Presunto;
2º Passo: Deite-os no azeite;
2.1. Poder discricionário:
Tipo de Azeite;
2.2. Poder vinculativo: Quantidade
de Azeite a utilizar;
3º passo: Coloque a azeite e o presunto
numa frigideira e deixe-os torrar de 2-3 minutos;
3.1. Poder discricionário: Tempo que
tem para deixar torrar;
3.2. Poder vinculativo: Ter de
torrá-los;
4º Passo: Retire os ingredientes da
frigideira e corte 4 fatias de pão. Aloure na mesma frigideira de um lado e de
outro;
4.1. Poder discricionário:
Tipo de pão dentro (Rústico, Saloio) e devida espessura do Corte;
4.2. Poder vinculativo: Torrar o
pão, sem nunca o queimar;
5º Passo: coloque o pão num prato côncavo
para ir ao forno;
5.1. Poder discricionário: O
tipo de prato não altera a receita;
5.2. Poder vinculativo: O prato
terá que ter condições para se submeter a altas temperaturas
6º Passo: disponha as fatias de pão sobre
o prato;
6.1. Poder discricionário: a
forma como dispõe as fatias no prato;
6.2. Poder vinculativo: dispor as
fatias num prato que vá ao forno;
7º Passo: Deite sal e Pimenta;
7.1. Poder discricionário: quantidade de sal e pimenta
7.2. Poder vinculativo: estas terão de ser obrigatoriamente as
especiarias usadas;
8º Passo: Separe as gemas das claras. As
claras deverão ficar em castelo pouco firme;
8.1. Poder discricionário:
como as separa, não interessa para o final da receita se usa uma maquina para
as separar; Poder vinculativo: claras em castelo pouco firmes.
Pouco firme tem de se interpretar, fica a
margem de cada um. Mas não podem ser excessivamente batidas nem muito pouco
batidas.
8.2. Poder vinculativo: Separar as
claras e batê-las em castelo pouco firmes
(o conceito de pouco firme fica à
margem de cada um, não podem ser nem excessivamente batidas, nem pouco batidas;
9º Passo: Misture todos os ingredientes,
exceto o presunto, e coloque por cima do pão;
9.1. Poder discricionário:
qual deles junta primeiro e como mistura;
9.2. Poder vinculativo: é
obrigatória a mistura de todos os ingredientes, exceto o presunto.
10º passo: Leve o prato ao forno, com calor
por baixo e coza durante 8-10 minutos;
10.1. Poder discricionário:
temperatura do forno, a receita nada nos diz quanto a este elemento;
10.2. Poder vinculativo: Calor por baixo e deixar de 8-10 minutos.
Na receita
existem passos onde não existe margem de discricionariedade para o “chefe”
decidir. Porém, existem alguns pontos em que o chefe decidiu, através da
interpretação, isto de modo a não alterar a receita. Como podemos verificar, o
chefe ao seguir uma receita, tem poder de decidir sobre determinadas matérias
(Quantidades utilizadas, forma do corte, tipos de aquecimento do forno) e
quanto a outras, nada pode fazer (Ingredientes, duração da receita no forno).
Com base na receita, é possível concluir que os órgãos da administração são
sempre detentores de poderes vinculativos e poderes discricionários. Se agir de
acordo com o que é vinculativo, estará a cumprir a lei, ou seja, uma delícia!
BIBLIOGRAFIA:
DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo – Volume I, 4ª Edição, Almedina, 2015.
QUEIRÓ, Afonso, O Poder Discricionário da
Administração, 2.ª ed., 1948, Coimbra Editora;
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