A construção da noção de direito subjetivo, não remontando ao
Direito Romano, começou no Direito Privado e foi evoluindo ao longo dos tempos,
sempre com uma considerável carga ideológica, uma vez que se trata de uma
questão tem consequências consideráveis na liberdade de atuação dos sujeitos
numa relação jurídica. Na doutrina germânica, tanto Savigny, como Jhering
apresentaram as suas definições. Enquanto o primeiro autor defendia uma
concepção de direito subjetivo como um poder de vontade, que era reconhecido ao
sujeito, Jhering encarou a questão de uma forma mais objetiva, reduzindo o
direito subjetivo a um mero expediente técnico, à segurança do aproveitamento
de um determinado bem, devendo os interesses alvo de proteção juridicamente
relevantes.
Contra estas duas concepções prenunciou-se a escola
jurídico-formal, nomeadamente em Portugal, Menezes Cordeiro, que considera o
direito subjetivo a permissão normativa especifica do aproveitamento de um bem.
Numa fase inicial, os direito subjetivos públicos não eram
reconhecidos, uma vez que, apesar da relação jurídica se apresentar como
conceito central do direito administrativo da atualidade, nem sempre foi assim.
É a partir do reconhecimento da existência de relações jurídicas entre a
administração e os privados que são também considerados os direitos subjetivos
públicos.
A corrente defendida por autores como Kelson, expressou-se contra a
utilização do conceito de relações jurídicas no direito administrativa,
nomeadamente quando estas se estabelecessem entre a administração e os
privados.
Uma segunda doutrina, adotada por inúmeros autores, dentre os quais
Otto Meyer, defendia a existência de relações jurídicas administrativas,
considerando, no entanto, os privados, como meros objetos, não lhes concedendo
a condição de sujeitos de direito administrativo. Estes tinham uma relação de
sujeição com a administração, não tendo quaisquer poderes que pudessem ser
oponíveis a esta. Em Portugal, Marcello Caetano, ainda que não explicitamente,
enquadrava o seu pensamento nestas correntes, defendendo, numa fase inicial, um
“direito à legalidade”, negando, posteriormente, o conceito de relação jurídica
administrativa que, na sua concepção, se confundia com a relação processual,
tal como salientou Marcelo Rebelo de Sousa.
De acordo com autores como Maurer, existem relações jurídicas no
domínio de direito administrativo, em que o privado é um verdadeiro sujeito com
direitos e deveres, assim como a administração. O instituto da relação jurídica
só devia, no entanto, ser aplicado, em matérias relativas à administração
prestadora, onde seria mais vantajosa, uma vez que é fundamentalmente nessa
área que se estão em causa os direitos dos particulares.
Por fim, existe uma última corrente, em que a relação jurídica é considerada
o centro da atividade administrativa, sendo esta a defendida pelo regente. Segundo
o Professor Vasco Pereira da Silva, os cidadãos passam a ser vistos como
sujeitos na relação jurídicas, com deveres e direitos oponíveis perante a
administração. Estes direitos subjetivos consagram o princípio da dignidade
humana, algo fundamental no Estado de Direito e trazem consequências,
nomeadamente a nível do procedimento administrativo. O cidadão passa a ter a
possibilidade de ver os seus direitos tutelados, o que não acontecia em
construções como a Otto Meyer, em que perante a administração agressiva, o
cidadão não passava de um objeto. Todas as posições de vantagem atribuídas por
lei são direitos subjetivos. O que pode variar é a amplitude das vantagens
atribuídas por lei. O regime aplicável será sempre o mesmo.
Esta não é, no entanto, a única forma de conceber as posições
individuais do cidadão perante a administração. Freitas do Amaral, seguindo a
doutrina italiana, distingue entre direitos subjetivos e interesses protegidos.
Os primeiros fornecem uma proteção mais direta, o particular pode exigir á
administração o cumprimento da posição que eventualmente foi violada. Já em
relação aos interesses legítimos, o particular pode exigir apenas não ser
prejudicado e caso isso aconteça, recorrer aos tribunais.
A mesma distinção é adotada por João Caupers, para quem a relação
jurídica, mesmo existente, não implica a igualdade de posição entre o
particular e a administração, uma vez que esta tem efetivamente mais deveres e
mais direitos. Ainda assim, um equilíbrio deve ser alcançado, para que os
interesses de ambas as partes sejam protegidos.
Mesmo tendo em conta as divergências doutrinarias relativas ao
controverso tema que é a natureza das posições de vantagem dos particulares nas
relações jurídicas administrativas, a essencialidade da sua existência num
quadro de uma administração de estado pós-social é evidente. Os cidadãos são
sujeitos dessa relação, não meros administrados e como tal têm deveres sim, mas
também direitos, e mesmo admitindo que sejam em menor número que aqueles que a
administração possui, devem ser protegidos. Esse direito a uma defesa em caso
de uma agressão por parte da administração é uma das bases fundamentais de um
Estado de Direito e deve sempre ser respeitada, sob pena de retrocedermos à
velha administração agressiva, em que a promiscuidade entre os poderes
resultava sempre numa decisão desfavorável àquele que não passava de um
“administrado”.
BIBLIOGRAFIA
AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, volume I, 4ª ed., Almedina,
Coimbra, 2016.
SILVA, Vasco Pereira
da, “Em busca do Acto Administrativo Perdido”, Almedina, Coimbra, 2016
CORDEIRO, António Menezes, Tratado do Direito Civil, volume I, 4ªed., Almedina, 2012
Maria Beatriz Silva
Nº 57107
No comments:
Post a Comment