Friday, December 8, 2017

A Administração Autónoma – Autarquias Locais

Penso que seja necessário fazer uma breve contextualização da organização administrativa Portuguesa, para posteriormente enquadrar o tema da Administração Autónoma, mais especificamente das Autarquias Locais.

Assim, a partir do art. 199.º/ d) CRP, poder-se-á aferir três grandes modalidades de Administração Pública, sendo elas a administração direta do Estado, a administração indireta do Estado e a administração autónoma. O art. 267.º/3 CRP permite a criação de entidades administrativas independentes, conclui-se que se pode falar de uma quarta modalidade de Administração Estadual, a administração independente.

Na opinião do Professor Diogo Freitas do Amaral, a Administração Autónoma será aquela que prossegue interesses públicos próprios das pessoas que a constituem e por isso se dirige a si mesma, definindo com independência a orientação das suas atividades, sem sujeição a hierarquia ou a superintendência do Governo
.
Em suma pertence à Administração Autónoma portuguesa as associações públicas, as autarquias locais e as regiões autónomas da Madeira e dos Açores.

Autarquias Locais

A Constituição da República Portuguesa apresenta no seu artigo 235º/2, uma breve noção de Autarquia Local, suscetível de ser completada.

Neste sentido, o Professor Marcello Caetano definiu as autarquias locais como pessoas coletivas públicas de população e território, correspondentes aos agregados de residentes em diversas circunscrições do território nacional, e que asseguram a prossecução dos interesses comuns resultantes da vizinhança mediante órgãos próprios, representativos dos respetivos habitantes.
Embora, as Autarquias Locais possam ser fiscalizadas e subsidiadas pelo Estado, são independentes, ou seja, não estão num estado de sujeição perante ele. Da opinião do Professor Marcelo Caetano emergem quatro elementos essenciais: o território, o agregado populacional, os interesses comuns e os órgãos representativos.

Associado à existência de autarquias locais surge o conceito jurídico-político da descentralização, por um lado, consiste numa autoadministração por parte das populações (descentralização em sentido politico), por outro lado, consiste no desempenho das tarefas da Administração Pública por várias pessoas coletivas (descentralização em sentido jurídico). Assume relevância referir, o princípio da autonomia local como garantia do pluralismo dos poderes políticos e consequência de uma limitação do poder político.

O regime jurídico encontra-se distribuído, por três diplomas, na Constituição da República Portuguesa, nos artigos 235.º e ss.; na Lei das Autarquias Locais (LAL) e na Lei da Composição e Funcionamento das Autarquias(LCFA).

 Freguesias

Para o Professor Diogo Freitas do Amaral, Freguesias são as autarquias locais que, dentro do território municipal, visam a prossecução de interesses próprios da população residente em cada circunscrição paroquial.
Torna-se necessário enumerar as principais atribuições das mesmas, reguladas pelo artigo 7.º LAL (Lei das Autarquias Locais). São elas:
  •           Realizar o recenseamento eleitoral e, no mesmo plano, desenrolar os processos eleitorais de carácter político e administrativo, através dos seus serviços (plano político).
  •          Promover obras públicas, assim como administrar os bens sujeitos à sua jurisdição (plano económico).
  •          Agir em prol do desenvolvimento da cultura popular e da assistência social (plano cultural).

Relativamente aos órgãos da freguesia, são os seguintes:

  •        Assembleia de Freguesia – órgão deliberativo e representante dos habitantes.
  •         Junta de Freguesia – órgão executivo.

Penso que, assume relevância fazer uma breve referência ao sistema eleitoral dos órgãos enunciados anteriormente, realiza-se em duas partes: primeiro, os eleitores elegem os membros da Assembleia de Freguesia e, subsequentemente, no âmbito da Assembleia, elegem a Junta de Freguesia – sendo, por isso, uma eleição indireta.

Porém, o art. 247.º da Constituição da República Portuguesa refere que, freguesias podem constituir, nos termos da lei, associações para administração de interesses comuns. As associações de freguesias serão, por isso, verdadeiras pessoas coletivas publicas, ao abrigo do art. 63.º/1 LAL.

Por fim, um conceito que encontra a sua definição na doutrina é o das Organizações de Moradores, apesar de estar referido na Constituição da República Portuguesa. Assim, para o Professor Diogo Freitas do Amaral, as organizações de moradores podem ser concebidas como entidades que agrupam o conjunto dos moradores de um bairro, de um loteamento urbano, de uma rua, ou até só de um prédio, com vista à defesa e promoção dos interesses comuns aos residentes na respetiva área. Contudo, esta figura acaba por ser alvo de algumas críticas, por parte de restante doutrina.


 Municípios

Em último lugar, temos os Municípios. Contudo, nem a Constituição da República Portuguesa, nem a Lei das Autarquias Locais, nos apresenta uma definição clara de município. Porém, a Lei das Autarquias Locais, de 1997, apresentou uma definição que não se distancia muito da realidade. No entanto, o mais correto é recorrer a uma construção doutrinária para definirmos este conceito.
Assim, o Professor Diogo Feitas do Amaral refere que um Município é, uma autarquia local que visa a prossecução de interesses próprios da população residente na circunscrição concelhia, mediante órgãos representativos por ela eleita.

Para fazer uma caracterização partimos da criação, modificação e extinção de municípios, através da análise da Lei – Quadro da criação de municípios e do art.º 167.º n) CRP. Deste modo, afere-se que, são criados na sequência de uma proposta de lei ou de um projeto de lei. Deduz-se que a iniciativa cabe ao Governo e aos deputados, consequentemente, cabe apenas a Assembleia da Republica a aprovação dos mesmos, conclui-se que a este órgão é reservada a competência para a criação de municípios.

No que tange à questão da transferência de atribuições do Estado para o município, é feita através da transferência de competências por via legislativa e da delegação de competências que concretiza a descentralização administrativa. Esta transferência de competências por via legislativa ocorre, obviamente, por ato legislativo, e segundo o art.º 114º LAL, sem previsão de duração e para todos os municípios. Deverá prever, os recursos humanos, os patrimoniais e financeiros, necessários ao exercício das competências transferidas pelos órgãos autárquicos, de acordo com o artigo 115º/1 da LAL. Posteriormente, a transferência de competências funda-se na celebração de um contrato interadministrativo, de acordo com o artigo 120º da LAL, assente num acordo de vontades (art. 116.º e ss.), cujo conteúdo deverá respeitar o disposto no art. 122.º LAL. Por fim, o período de vigência do contrato coincide, normalmente, com a duração do mandato do Governo que o subscreveu, considerando-se, posteriormente, renovado após a tomada de posse de um novo Governo, de acordo com os artigos 126º/ 1e2 da LAL).

No que toca aos órgãos do município, o artigo 250º da Constituição da República Portuguesa, exclui o Presidente da Câmara Municipal. Porém, o Professor Diogo Freitas do Amaral, adota a posição do Código Administrativo de 1936-40, definindo como órgãos municipais: a Assembleia Municipal, a Câmara Municipal e o Presidente da Câmara Municipal. Seguidamente irei fazer uma breve análise, dos órgãos apresentados.

Assim, Assembleia Municipal será o órgão deliberativo do município, funcionando como parlamento municipal. É constituída por membros por inerência (presidentes das juntas de freguesias) e membros eleitos (em número superior ao dos presidentes das juntas de freguesia que a integram) não sendo eleita diretamente, de acordo com o artigo 251º da Constituição da República Portuguesa. De acordo com o art. 25.º LAL, a Assembleia Municipal tem funções de orientação geral do município, de fiscalização da Câmara Municipal, de regulamentação, tributária e de decisão superior.
A Câmara Municipal constitui o órgão colegial do tipo executivo a quem está atribuída a gestão dos assuntos municipais, sendo designada de corpo administrativo do município, sendo, diretamente, eleito pela população do município. O artigo 57.º LCFA refere que, a Câmara Municipal é composta pelo Presidente da Câmara e pelos vereadores, o número de vereadores varia consoante a dimensão do município.

Em último lugar, temos a figura do Presidente da Câmara, como referido anteriormente, não aparece mencionado na Constituição da República Portuguesa, assim, poder-se-ia dizer que não é considerado um órgão município, de acordo com o artigo 250.º da CRP. Porém, de acordo com os preceitos constituintes da LAL, o Presidente da Câmara é um órgão do município, uma vez que dispõe de inúmeras competências próprias e delegadas. À luz do artigo 35.º da LAL o Presidente da Câmara desempenha, funções de carácter executivo, presidencial, decisório e interlocutório. O Presidente da Câmara pode exercer uma competência delegada, nos termos do artigo 34.º/1 da LAL.
Podemos concluir que, o município toma decisões através dos seus órgãos. Não entanto, essas decisões carecem de ser preparadas e executadas e, para o efeito, existem serviços. São os chamados serviços municipais, em sentido amplo. Destes, a lei distingue os serviços municipais, em sentido restrito e os serviços municipalizados.

Importa referir que, desde cedo, os municípios tiveram o hábito de se associar entre si, com vista a realização conjugada de interesses específicos comuns, surgindo assim as associações entre municípios.

O referendo local é um o instituto de relevo particular, no âmbito autárquico, ligado à noção de autonomia local. Este confere a possibilidade de efetuar consultas sobre assuntos relacionados com o quotidiano das populações locais, distinguindo-se, como instrumento de sensibilização dos cidadãos para a existência e necessidade de decisão de problemas que lhe são próximos.

Juntamente com o referendo associam-se outras formas de democracia participativa no âmbito local, tais como: o direito de petição o direito de intervenção nas reuniões dos órgãos autárquicos e o direito de requerer a convocação de reuniões extraordinárias dos órgãos deliberativos autárquicos. 

Para concluir, nem sempre o nosso sistema de administração local autárquica funcionou como atualmente. Houve vários fatores que influenciaram a evolução de administração local autárquica tais como: a diminuição de atribuições e recursos das autarquias locais, originando uma visão pessimista e redutora pela doutrina, oposta ao que se observa, nos dias de hoje. Em suma, ao longo desta exposição podemos considerar que as Autarquias Locais têm uma elevada importância a nível político, a nível social que, de outra forma, o Estado, só por si, não conseguiria assegurar. Deste modo, têm que se assegurar que o papel das autarquias locais, não é posto de parte nem é desprezado. Por fim, é aconselhável que, daqui para a frente, se tenha em vista uma otimização da administração local autárquica.   


Bibliografia: 

  • FREITAS DO AMARAL, Diogo, Curso de Direito Administrativo, Vol I, 4ª ed., 2015, Almedina.
  • MARCELO REBELO DE SOUSA / ANDRÉ SALGaDO DE MATOS, Direito Administrativo Geral, Tomo I, D. Quixote, Lisboa, Introdução e Princípios Fundamentais, 3ª edição, Dom Quixote, 2004.

Pedro Maria Morgado da Conceição 
Nº 56884    Turma B    Subturma 14








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