Introdução
A Administração Pública é composta por
várias instituições públicas como, por exemplo, o Estado, mas também por algumas
instituições privadas que, devido à atividade a que se dedicam, não podem
deixar de ser consideradas na ótica do interesse geral da população. A estas
instituições privadas atribui-se a designação de Instituições Particulares de Interesse Público.
As entidades supramencionadas são
privadas e criadas por iniciativa dum particular através de atos de direito privado.
Contudo, ainda assim, por tratarem da prossecução de fins de interesse público
ficam submetidas a um regime parcialmente definido pelo Direito Administrativo.
De tal maneira, dispõem o prof. Freitas do Amaral, definem-se como “pessoas
coletivas privadas que, por prosseguirem fins de interesse público, têm o dever
de cooperar com a Administração Pública e ficam sujeitas, em parte, a um regime
especial de Direito Administrativo”
Segundo o Prof. Marcello Caetano,
dever-se-ia denominar tais entidades de “pessoas coletivas de direito privado e
regime administrativo”. Porém, o Prof. Freitas do Amaral defende a denominação
anteriormente fornecida devido à combinação de direito privado com direito
administrativo no regime destas entidades e não a supremacia única de um deles.
A par de tal declaração, o Prof. Freitas do Amaral justifica ainda que a referência
ao regime afasta a relevância da natureza e que tal deve realizar-se de maneira
totalmente inversa, devendo ver-se o regime como resultante da natureza. No que
reporta ao âmbito do regime, não se trata de inserção orgânica de entidades
privadas no âmbito público nem o alargamento deste para abranger as ditas
entidades. É apenas um modo de descentralização funcional do setor público
através da transferência de poderes próprios deste para a área privada.
Existem três situações possíveis:
- Atividades administrativas de
interesse coletivo cujo desempenho é confiado a entidades particulares devido à
impossibilidade da Administração de realizar o conjunto total de atividades – exercício privado de funções públicas.
- Atividades privadas
sistematicamente fiscalizadas ou dirigidas pela Administração, devido à
relevância social que a lei lhes atribui – controlo
público de atividades privadas.
- Exercício simultâneo e cooperante
da mesma atividade, em prol do interesse público, por entidades de direito
público e de direito privado, sendo estas últimas de criação admitida pela lei
em determinadas áreas – coexistência colaborante
entre atividades públicas e privadas.
Características das Instituições Particulares de
Interesse Público
- São pessoas coletivas privadas provenientes
de iniciativa privada;
- Exercem atividades de gestão pública ou
de gestão privada;
- Regime jurídico aplicável é misto (no
geral, direito privado, mas nalguns aspetos específicos, direito administrativo
- público);
Espécies
Faz-se a divisão destas instituições em:
- Sociedades de interesse coletivo – se tiver
carácter de sociedade.
- Pessoas coletivas de utilidade pública–
se tiver carácter de associação ou fundação. E, dentro destas, segundo o DL nº
460/77, de 7 de novembro:
-
Pessoas coletivas de utilidade pública
administrativa – quando os fins de interesse geral coincidem com
atribuições particularmente importantes da Administração Pública. Quando os
fins não as qualificam enquanto instituições particulares de solidariedade
social. Exemplo: associações de bombeiros voluntários.
-
Instituições Particulares de Solidariedade
Social – Instituições cujos fins as qualifiquem enquanto instituições
particulares de solidariedade social. Exemplo: Misericórdias.
-
Pessoas coletivas de mera utilidade
pública – quando se prosseguem quaisquer fins de interesse geral.
Sociedades de Interesse
Coletivo
Definição
Definidas como empresas privadas, de fim
lucrativo, que por exercerem poderes públicos ou estarem submetidas a uma
fiscalização especial da Administração Pública, ficam sujeitas a um regime
jurídico específico traçado pelo Direito Administrativo. Distinguem-se das
pessoas coletivas de utilidade pública pois têm um fim lucrativo e são,
normalmente, sociedades.
Espécies
Dentro das Sociedades de Interesse
Coletivo distinguem-se:
- Sociedades concessionárias de serviços públicos, de obras públicas ou
de exploração de bens do domínio público.
-
Empresas que prestem serviços públicos/de interesse geral.
- Empresas participadas que prestem serviços públicos ou serviços de
interesse geral.
- Empresas que exerçam poderes
públicos.
- Empresas que exerçam atividades em
regime de exclusivo ou de privilégio não conferido por lei geral.
Regime
Jurídico
A subordinação das sociedades de interesse
coletivo a um regime jurídico específico justifica-se, ou porque a empresa
privada se dedica ao exercício de poderes públicos para si transferidos pela
Administração, ou porque as circunstâncias obrigaram a colocação da empresa num
regime de fiscalização especial por motivos de interesse público.
Existe, portanto, um regime duplo com deveres
e privilégios especiais que, normalmente, são atribuídos apenas a empresas
públicas. Na falta de regime genérico, vale o que a lei dispuser para cada caso
ou categoria.
Os privilégios
das Sociedades de Interesse Coletivo mais importantes são:
- Isenções fiscais.
- Direito de requerer expropriação ao
Estado por utilidade pública de terrenos que necessitem para se instalar.
- Possibilidade de beneficiar do regime
jurídico das empreitadas de obras públicas.
Os deveres
especiais impostos por lei são:
- Incompatibilidades e limitações de
remuneração estabelecidas por lei para os gestores públicos, não podendo esta
exceder o vencimento de um Ministro.
- Empresas sujeitas às regras e princípios
do RSEL, se forem empresas participadas pelo setor público.
- Funcionamento das empresas submetida a
fiscalização, através de delegados do Governo. Neste caso, é importante não
confundir a figura do delegado (fiscalizam o funcionamento da empresa) com a
dos administradores (representam o Estado-acionista).
Natureza
Jurídica
Farão estas entidades parte da Administração
Pública em sentido orgânico ou subjetivo? Como resposta, existem duas teses:
-
Tese Clássica: por
serem entidades privadas, não fazem parte da Administração Pública, são apenas
seus colaboradores.
- Segunda
Tese: pelo
facto de exercerem funções públicas tornam-se órgãos indiretos da Administração.
Ou seja, em vez de se considerar como uma transferência de poderes públicos
para uma entidade privada, considera-se como uma entidade que passará a ser um
órgão indireto da Administração, e que, por isso, perde o seu carácter privado.
O Prof. Freitas do Amaral defende a tese
clássica, relevando o carácter privado destas pessoas coletivas privadas sujeitas
a regime administrativo e a sua posição enquanto sujeitos privados, criados por
iniciativa privada. Em segundo lugar, adianta ainda que os seus atos são de
direito privado. Esta tese é defendida também pois o regime jurídico da
responsabilidade civil aplicada a estas entidades é o regulado no Código Civil,
não o de Direito Administrativo e os trabalhadores não pertencem à função
pública, sendo-lhes aplicável o regime do contrato individual de trabalho. Por
último, apresenta um argumento que decorre da interpretação do art.82º da CRP,
onde se incluem as sociedades de interesse coletivo no setor privado.
De tal modo, é hoje defendido que as
sociedades de interesse coletivo não pertencem à Administração, constituindo-se
como meros colaboradores.
Pessoas
Coletivas de Utilidade Pública
As pessoas coletivas privadas de fim não
lucrativo, ou seja, as associações e fundações, podem ser entidades de
utilidade particular (desenvolvem atividades que não interessem primacialmente
à comunidade nacional ou região, apenas a grupos privados, e/ou não aceitam
cooperar com a Administração, central ou local) ou entidades de utilidade
pública (cooperam com a Administração, central ou local, em termos de merecerem
da parte desta a declaração de “utilidade pública”). Exemplos destas pessoas
são, por exemplo, as creches e jardins de infância, as Misericórdias, as
associações de bombeiros voluntários, entre outras.
Assim, as pessoas coletivas de utilidade
pública são privadas, têm de prosseguir fins não lucrativos de interesse geral
nacional ou local, têm de cooperar com a Administração e precisam de ter a declaração
de utilidade pública. São, consequentemente, distintas das empresas de
interesse coletivo por estas seguirem um fim lucrativo e as pessoas coletivas
de utilidade pública não, e por apenas serem consideradas de utilidade pública
as pessoas coletivas privadas de fim não lucrativo que tenham declaração da
Administração. Segundo o art.157º do CC, as empresas de interesse coletivo são
sociedades, enquanto que as pessoas coletivas de utilidade pública assumem a
forma de associações, fundações ou cooperativas.
Espécies
As pessoas coletivas de utilidade pública
podem classificar-se consoante os seguintes critérios:
- Natureza
do substrato (associações, fundações e cooperativas)
- Âmbito
territorial de atuação (pessoas de utilidade geral, regional ou local)
- Segundo os fins que prosseguem e o regime
jurídico a que estão sujeitas:
-
Pessoas coletivas de mera utilidade
pública – clubes desportivos- definindo-se o conteúdo por exclusão das
outras duas opções. Não estão sujeitas a controlo financeiro nem tutela
administrativa por parte do Estado.
-
Instituições particulares de
solidariedade social – Misericórdias – Constituem-se para dar expressão
organizada ao dever moral de solidariedade e justiça entre os indivíduos. Estão
sujeitas a tutela administrativa e apoio financeiro do Estado.
-
Pessoas coletivas de utilidade pública
administrativa – associações de bombeiros voluntários – pessoas que, não
sendo instituições particulares de solidariedade social, prosseguem algum dos
fins previstos no art.416º do CA. Estão sujeitas a tutela administrativa e
controlo financeiro do Estado.
É importante referir que, atualmente, é
unânime a consideração de que, pelo avultado património, seja necessária a
fiscalização para evitar a dissipação de bens e a sua gestão em função do interesse
pessoal.
Os traços gerais do regime jurídico
aplicável estão previstos no DL 460/77, de 7 de novembro, salvo regime jurídico
específico, dispondo que: não podem desenvolver atividades económicas com
entidades que não beneficiem de estatuto de utilidade pública, nem exercer as
mesmas em função de interesses privados. Têm de estar registadas numa base de
dados, gozam das isenções fiscais e tarifas previstas no art.9º e 10º, podem
requerer a expropriação por utilidade pública dos terrenos de que careçam para prosseguir
os seus fins estatutários e têm de apresentar um relatório e contas do
exercício, prestar informações solicitadas e comunicar alterações de estatutos,
segundo art.12º.
É importante referir que as associações ou
fundações que prossigam fins de beneficência, humanitários, de assistência ou
de educação, podem ser declaradas como sendo de utilidade pública logo no
momento da sua constituição. As que prosseguem outros fins, só podem ser
declaradas como tal após três anos de efetivo e relevante funcionamento, a não
ser que se verifique o disposto no art.4º/3.
Assim, sendo este o regime jurídico geral
aplicável, dispõe o regime específico:
-
que no caso das pessoas coletivas de
mera utilidade pública, o regime a considerar é o supramencionado.
-
que nas instituições particulares de solidariedade
social, aplica-se ainda o princípio da autonomia institucional, do apoio do
Estado e das autarquias locais, os direitos dos beneficiários, as regras sobre
criação, organização, gestão e extinção e as normas sobre fiscalização
administrativa, destituição judicial dos órgãos e encerramento administrativo,
havendo uma secção especial destinada às Misericórdias. Os princípios
enunciados encontram-se expostos no DL nº 460/77, de 7 de novembro.
-
que nas pessoas coletivas de utilidade
pública administrativa, além do DL indicado na hipótese acima, o seu regime
específico consta do Código Administrativo. Tem relevância referir a sujeição
dos seus atos e atividades às regras da contabilidade pública, ao controlo do
Tribunal de Contas e à fiscalização dos tribunais administrativos.
Nota-se, portanto, o carácter misto do
regime aplicável a estas entidades: beneficiam de determinados privilégios por
prosseguirem fins gerais, dos quais as pessoas privadas estão afastadas; mas
ficam sujeitas a deveres e encargos especiais, dos quais as pessoas privadas
estão afastadas, por prosseguirem fins que interessam diretamente à
Administração enquanto zeladora do bem comum.
Também neste caso se discute o carácter
público ou privado destas entidades. A propósito do exposto, são possíveis
distinguir duas teses:
- Tese tradicional: defende Marcello Caetano que, por resultarem de
substrato criado por iniciativa particular, para fim por estes determinado, e por
cujo reconhecimento resultar de ato do poder público, se consideram pessoas
privadas de regime administrativo.
- Tese Contrária: defende Afonso Queiró que, por se acharem sujeitas
a um regime jurídico de direito público, as considera como pessoas coletivas de
direito público.
Assim, em suma e concluindo, o Prof.
Freitas do Amaral defende que as pessoas coletivas de utilidade pública são entidades
privadas, que apenas colaboram com a Administração. Avança ainda que se deve atribuir
o nome, a estas entidades humanitárias e altruístas, de terceiro setor ao
estarem longe do setor público pelo seu espírito e do setor privado lucrativo
pelos seus objetivos. A sua autonomia tem importância crucial e é indispensável
à existência de uma ordem democrática e pluralista.
Trabalho
realizado por:
Carolina Matroca
Nº 56795
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