Enquadrada como uma forma de desconcentração
de poderes derivada, dependente de um ato específico de transferência de
competências, opõe-se à desconcentração originária, que se verifica nos casos
em que é a própria lei a reparti-las. Adicionalmente, como fenómeno de
desconcentração de competências que é, naturalmente conduz a um
descongestionamento de competências, permitindo a outros órgãos exercerem
poderes decisórios que numa administração concentrada nunca teriam lugar.
Como define o Professor Freitas do Amaral,
entende-se por delegação de poderes “o
ato pelo qual um órgão da administração, normalmente competente para decidir em
determinada matéria, permite, de acordo com a lei, que outro órgão ou agente
pratiquem atos administrativos sobre a mesma matéria”
Desta forma, identifica três requisitos para
que haja uma delegação de poderes:
1.
Lei de habilitação
2.
Elementos subjetivos na forma de
dois órgãos administrativos, nomeadamente delegante e delegado
3.
Ato de delegação propriamente dito
Regime
Jurídico
A figura da delegação de poderes encontra-se
regulada pelo CPA, mais especificamente nos artigos 44º e seguintes. Em primeira linha, a possibilidade de
haver delegação de poderes depende da existência de uma lei que a preveja, o
que decorre do art.º44, nº1 do CPA. Sem a presença desta habilitação legal
estaremos na verdade perante uma mera renúncia de competências e por isso
ferida de nulidade (art.º36, nº2 do CPA). Por consequência, o ato que possa vir
a ser praticado ao abrigo desta relação de delegação estará viciado por falta
de competência.
É de referir ainda a existência de um certo
leque de poderes previstos no art.45º do CPA que são indelegáveis. Assumem esta
natureza:
a)
A globalidade dos poderes do
delegante
b)
Os poderes suscetíveis de serem exercidos
sobre o próprio delegado
c)
Poderes as exercer pelo delegado
fora do âmbito da respetiva competência territorial
A alínea a) vem vedar o que era a regra até à
inclusão deste artigo no CPA, que permitia que na falta de indicação, o poder
transferido para o delegado coincidia com o que o delegante detinha na
totalidade. Desta forma, na falta de especificação dos poderes que são
delegados ou dos atos que podem ser praticados, consideram-se delegados todos
os poderes do delegante exceto aqueles que possam ser exercidos sobre o próprio
delegado, como decorre da alínea b).
A lei admite ainda a possibilidade de haver
subdelegação de competências sendo que, para tal, já não será necessária uma
autorização legal. Esta figura encontra-se regulada no CPA, especificamente nos
artigos 46º e seguintes. Nestes termos, o órgão subdelegante pode sempre
subdelegar, salvo se o delegante ou subdelegante se opuser. Para que o delegado
possa subdelegar necessita da autorização do delegante, ao passo que o
subdelegado já não precisará da autorização para também ele subdelegar.
Do ponto de vista do conteúdo o órgão
delegante ou subdelegante deve especificar concretamente quais são os poderes a
ser delegados (art.47º CPA), impedindo-se assim uma delegação genérica e
demasiadamente vaga. Simultaneamente, os atos de delegação estão ainda sujeitos
a publicação, também de acordo com o art.47º, nº2 do CPA, remetendo-se para
esse efeito para o disposto no art.159º. A falta de publicação nos termos deste
artigo determina a incompetência do órgão delegado, que não cumprindo os
requisitos legais exigidos, não pode ser qualificado como tal. Tal requisito
impõe-se pelo facto de a relação de delegação de poderes ter uma eficácia
externa, devendo, como tal, ser dado o seu conhecimento aos potenciais
interessados.
Exige-se ao órgão delegado ou subdelegado que
faça menção da sua qualidade, estabelecendo-se que a sua falta, ainda que não
determine a invalidade do ato, não pode vir a prejudicar os interessados pelo
seu desconhecimento. (art.48º CPA). Esta disposição concretiza, em certa
medida, o dever de informação e de transparência que se exige de órgãos e
agentes administrativos.
O órgão delegante, para além de poder emitir
diretivas ou instruções vinculativas para o delegado, tem ainda o poder de
avocar, anular, revogar ou substituir o ato praticado pelo delegado ao abrigo
da delegação. (Art.49º)
Por fim, a extinção da delegação dá-se por
várias formas, podendo extinguir-se por revogação ou anulação, e por
caducidade, resultante de se terem esgotado os seus efeitos ou em virtude da
mudança dos titulares dos órgãos na relação de delegação.
Natureza
Jurídica
Quanto à natureza jurídica do instituto da
delegação de poderes existem várias teses, de entre as quais se torna relevante
referir as seguintes:
1)
Tese da transferência ou alienação
de competências
Segundo este
entendimento, a delegação de poderes é um ato de transmissão da competência do
delegante para o delegado. Os poderes da titularidade do delegante passam, em
virtude do ato da delegação e com fundamento na lei da habilitação, para a
esfera de competência do delegado. Como alertam alguns setores da doutrina, se
a delegação tivesse efetivamente esta natureza, então os poderes delegados deixariam
de pertencer, na sua totalidade, ao delegante, desligando-se este de toda e
qualquer responsabilidade quanto a esses mesmos poderes. Não será esta, por
várias razões, uma boa solução para esta questão, falhando em explicar
corretamente o regime jurídico da delegação de poderes.
2)
Tese da autorização
Para os defensores
desta tese, o que se verifica é que a lei de habilitação confere uma
competência condicional ao delegado, sobre as matérias em que permite a
delegação. Conclui-se daqui que mesmo antes da delegação, o delegado já é
competente, carecendo apenas da permissão do delegante. Deste modo, a delegação
será apenas um ato pelo qual um órgão permite a outro o exercício de poderes
próprios, tendo por isso, a natureza de autorização. À semelhança da primeira
tese, também esta falha em explicar adequadamente o regime jurídico da
delegação de poderes por vários motivos, sendo mais importante o facto de
parecer ser contrária à letra da lei, que em nenhum lugar nos permite inferir
que o órgão delegado é já competente na matéria delegada.
3)
Tese da transferência do exercício
Sendo a tese
maioritariamente defendida pela doutrina, entende que a delegação de poderes
constitui uma verdadeira transferência do delegante para o delegado, não da titularidade
dos poderes, mas sim do seu exercício. Assim, o órgão delegado, quando exerce
os poderes delegados, está a exercer uma competência do delegante, uma
competência que só existe por causa do ato de delegação. A titularidade,
todavia, permanecerá sempre na esfera do órgão delegante, o que também
justifica, em parte, a possibilidade de revogação, avocação e orientação, em
certos casos.
BIBLIOGRAFIA:
DIOGO FREITAS DO AMARAL, «Curso de Direito
Administrativo», volume I, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2015
JOSÉ EDUARDO FIGUEIREDO DIAS/FERNANDA PAULA
OLIVEIRA, «Noções Fundamentais de Direito Administrativo», 2ª Edição, Almedina,
2011
FERNANDO GONÇALVES, MANUEL JOÃO ALVES, VÍTOR
MANUEL FREITAS VIEIRA, RUI MIGUEL GONÇALVES, BRUNO CORREIA, MARIANA VIOLANTE GONÇALVES,
«Novo Código do Procedimento Administrativo, Anotado e comentado», 4ª edição,
Almedina,2016
Ricardo Ferreira
57016
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