Sunday, December 10, 2017





O conceito de Administração Estadual Indireta e os poderes que o Governo exerce sobre esta



               Este tipo de administração, apesar de ser realizado por pessoas coletivas diferentes do estado, ou seja, com personalidade jurídica distinta deste, continuam ainda assim a estar ligados de forma mediata e indireta (porque os seus fins já não são prosseguidos pela pessoa coletiva Estado mas por outras entidades que este cria e que ficam na sua dependência) à pessoa coletiva Estado, tal como a Administração Direta está ligada ao Estado mas de uma forma diferente (imediata e direta). Neste tipo de administração o Estado (conceito administrativo) confia a outros sujeitos de direito os seus fins pois essas mesmas atribuições têm ganho cada vez mais complexidade e uma maior diversidade. Esta administração realiza os fins do Estado, sendo que este os transfere por decisão sua (devolução de poderes), independentemente disso os fins continuam a ser atribuições próprias do Estado, que eventualmente poderá chamar para si novamente.

                O fundamento da existência da Administração Indireta prende-se sobretudo pela complexidade das funções do Estado (já mencionada supra) e pelo facto dessas mesmas atribuições (fins económicos, técnicos entre outros) serem incompatíveis de ser prosseguidas pela Estado de forma direta desde logo pela incompatibilidade existente com a burocratização e hierárquica que caracteriza os serviços do Estado. Sendo mais rentável e satisfatório que sejam prosseguidos por organismos diferenciados e com personalidade jurídica distinta do Estado. Estas entidades distintas do Estado têm património próprio, orçamento distinto, contas e pessoal próprio. Este tipo de administração poderá surgir também pela tentativa de fugir às regras da contabilidade pública (do próprio Orçamento de Estado e da Lei de Enquadramento orçamental) ou ainda da tentativa de proteger estas atividades de uma intervenção política.

As entidades englobadas neste conceito exercem as suas atividades em nome próprio, sendo responsáveis pelos atos que praticam e respondendo pelas suas próprias dívidas com o seu património. Porém a responsabilidade financeira (tanto inicial como final) pertence ao Estado pois é do seu interesse que esses fins sejam prosseguidos. Estas entidades têm autonomia administrativa e financeira (que se desdobra em autonomia patrimonial, creditícia, tesouraria e orçamental). Estas entidades completam o Estado e relacionam com ele. Uma característica que necessita de ser evidenciada é o facto destas entidades, regra geral, exercem competência sobre todo o território (pertencem assim à Administração Estadual Indireta) porém pode haver casos em que essas entidades são serviços locais ou regionais (integrando-se, respetivamente, na administração municipal ou regional indireta), não se integrando nem confundindo com os serviços que são levados a cabo pelas próprias autarquias locais (administração autónoma).

Estas entidades diferenciadas do Estado poderão ter vários graus de autonomia das quais podemos identificar os Institutos Públicos (integram o SPA- Setor Público Administrativo) e as Empresas Públicas (integram o setor Público Empresarial das quais: Sociedades Comerciais- que não pertencem à Administração Indireta, ou se pertencem são distintas- e as E.P.E- Entidades Públicas Empresariais). As sociedades Comerciais têm um carácter mais jus-privatístico enquanto que as E.P.E têm um carácter mais jus-publicista, se bem que estas ultimamente se tendem a aproximar mais do carácter jus privatístico. 

Quanto aos Institutos Públicos são uma pessoa coletiva pública de tipo institucional (com substrato numa instituição e não numa associação em que o substrato é um aglomerado de pessoas) criada para desempenhar funções administrativas de carácter não empresarial. Pertencem ao Estado ou a outra pessoa coletiva pública. Têm sempre personalidade jurídica e desempenham funções determinas, tratando apenas matéria que lei lhe submete e tendo fins singulares. Os institutos públicos não são sempre uma criação do estado nem se encontram sempre na dependência deste, pelo que haverá institutos públicos não estaduais (ex: institutos públicos de âmbito regional ou municipal que pertencem à administração autónoma e fazem parte respetivamente da administração regional ou municipal indireta). Há várias espécies de Institutos Públicos: 1) Serviços Personalizados 2) Fundações Públicas 3) Estabelecimentos Públicos.

1)      Desempenham funções equivalentes a de uma Direção-Geral. São serviços dos quais a lei confere personalidade jurídica, autonomia administrativa e financeira, funcionando como verdadeiras instituições independentes, desempenhando as suas funções de forma mais eficiente. Integrados nesta espécie ainda há uma subespécie que são os organismos de coordenação económica que se destinam a desenvolver atividades económicas (produção ou comércio) merecendo uma intervenção por parte do Estado diferente. Todas estas poderiam ser Direções-Gerais de ministérios mas não o são por se entender ser necessário a estas intervenham no mercado de forma rápida e ágil o que seria incompatível com a burocratização do estado.
2)      São pessoas coletivas públicas que assentam num património autónomo ao serviço dos fins sociais sendo que não têm fins lucrativos. A sua personalidade jurídica advém de um ato jurídico público e para estas instituições serem reconhecidas como fundações necessitam que uma parte significativa das suas receitas assentem em rendimentos do seu próprio património.
3)      Não são nem Direções-gerais, nem patrimónios, nem empresas. São assim institutos públicos com caracter cultural ou social, organizados como serviços abertos ao público e destinados a efetuar prestações individuais à generalidade dos cidadãos que delas necessitem. Ex: Universidades Públicas que não sejam fundações de
direito privado ou ainda hospitais do estado que não se transformaram em E.P.E.

                O que regula estes institutos públicos são sobretudo as respetivas leis orgânicas. Porém com a Lei Quadro nº 3/2004 de 15 de Janeiro, que contém uma regulação genérica dos institutos foi necessário articulá-la com as leis orgânicas já existentes. Os institutos públicos são pessoas coletivas públicas criados por ato legislativo e extintos ou modificados por um ato de igual valor ao que os constituiu.
                Quanto às empresas públicas, estas são organizações económicas de fim lucrativo, criadas e controladas por entidades jurídicas públicas. Nem todas as empresas públicas regulam o território nacional nem advêm do Estado, tal como acontece com os institutos públicos (supra mencionado), podendo pertencer à administração regional ou municipal indireta. Sendo ainda possível existir empresas públicas sem personalidade jurídica nem autonomia e que se integram ou na pessoa coletiva Estado ou nas Autarquias Locais ou ainda nas Regiões Autónomas. Todas as empresas nacionalizadas são empresas públicas mas o contrário já não sucede, pois uma empresa pública pode ser criada ex novo pelo Estado, ou que resulte da transformação de serviços burocráticos ou ainda pode advir do termo de uma concessão.

                O DL 133/2013 regula o SPE e distingue três espécies de empresas públicas: as empresas públicas sob forma privada, sob forma pública ou ainda participadas pelo Estado (estas últimas não são empresas públicas mas integram o SEE). Podem ainda haver empresas públicas sob várias formas jurídicas: podem ser pessoas coletivas públicas (E.P.E.) com direções e capitais públicos ou sociedades comerciais que são pessoas coletivas privadas que têm influência dominante do Estado ou de outras entidades públicas. Essa influência dominante pode representar uma maioria de capital, ou direito de voto, poder de nomear ou destituir membros da administração ou ainda o poder de influenciar as decisões da empresa por parte do Estado ou de outras entidades públicas (poderes especiais de controlo, artigo 9º/1 do DL). Ou seja, não tem de haver necessariamente uma maioria de capital público para a empresa estar sobre influência dominante. As empresas têm de ter necessariamente um fim lucrativo mesmo que na prática não gerem sempre lucro.

                Nas sociedades comerciais o regime aplicável é o regime das sociedades comerciais (Código das Sociedades Comerciais) enquanto que as E.P.E. são criadas por DL. Sobre as empresas públicas, seja qual a forma que adotem, o Governo tem sobre estas um poder de superintendência (orientação) de tutela (fiscalização) pois as empresas gozam de autonomia mas não de independência, elas não se auto-administram tendo de se conformar com os objetivos fixados pelo Governo. As empresas públicas genericamente estão sujeitas ao regime de direito privado (direito comercial) pois a atividade que desenvolvem é de gestão privada, sendo que necessitam de uma margem de liberdade e flexibilidade suficiente para desempenhar as suas atribuições e isso é incompatível com a burocratização pública. O próprio direito administrativo manda aplicar o direito privado às empresas, desde logo o DL 133/2013 artigo 14º/1. O princípio da gestão privada sujeita as empresas ao direito privado mas não só, elas também estão sujeitos ao direito público desde logo o direito fiscal, processual, entre outros. A regra geral é da gestão privada sendo que a gestão pública é feita mediante àquilo que é estritamente necessário art. 22º/2 do DL 133/2013.

A Administração Indireta está sob os poderes de tutela e superintendência do Governo (art. 199º d) da CRP) ao contrário da Administração Autónoma na qual só versam os poderes de tutela. Sendo o Governo a pessoa coletiva tutelar e as empresas e instituições públicas a pessoa coletiva tutelada. A tutela administrativa é o poder de fiscalização exercido que se desdobra ainda quanto à sua classificação quanto ao fim (de legalidade ou de mérito) e quanto ao conteúdo (integrativo, inspetivo, sancionatório, revogatório, substituitivo). A superintendência exercida é o poder de uma pessoa coletiva pública de fins múltiplos definir os objetivos e guiar a atuação das pessoas coletivas públicas de fins singulares. Traduz-se no poder de dar diretivas e recomendações definindo os fins mas deixando a definição dos meios para a entidade em causa.

Com o DL 199/84 e a revisão constitucional de 1982 a tutela que o Governo tinha sobre as Autarquias Locais (AL) deixou de ser uma tutela de mérito para passar a ser uma tutela de legalidade art. 242º da CRP. Porém quanto aos institutos públicos não se deverá retirar que não pode haver tutela de mérito. Há quem faça desse artigo constitucional uma interpretação literal considerando que se o governo só exerce tutela de legalidade sobre as AL então quanto ao conteúdo só se poderá exercer uma tutela inspetiva. Porém o prof. Freitas Do Amaral retira que também é possível fazer uma tutela integrativa sobre estas.  

As sociedades comerciais não pertencem à administração indireta pois não chegam a pertencer à administração pública. A questão passa por saber que poderes tem então o Governo sobre elas, sendo que para solucionar a questão o professor Paulo Otero encaixa estas sociedades na administração indireta privada que se encontra ao lado da administração indireta pública (onde se encaixam as E.P.E. e os institutos públicos).



Neuza Felizardo Carreira, Nº 57098, Turma B, Subturma 14



Bibliografia consultada:
FREITAS DO AMARAL, Diogo, Curso de Direito Administrativo, Vol I, 4ª ed., 2015, Almedina;
OTERO, Paulo, Manual de Direito Administrativo, Vol I, 2013, Almedina;
MARCELO REBELO DE SOUSA / ANDRÉ SALGDO DE MATOS, Direito Administrativo Geral, Tomo I, D. Quixote, Lisboa, Introdução e Princípios Fundamentais, 3ª edição, Dom Quixote, 2004.

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