Sunday, November 5, 2017

O Poder discricionário da Administração


  
A Administração está subordinada à lei nos termos do principio da legalidade, no entanto, essa regulamentação legal da administração umas vezes é precisa, desempenhando a administração tarefas puramente mecânicas, chegando a um resultado que é o único legalmente possível, outras nem tanto, não precisando uma única consequência jurídica para uma situação.

Num caso temos atos vinculados, no outro atos discricionários.

Apesar destas diferenças, não há atos totalmente vinculados, nem atos totalmente discricionários, regularmente são o resultado de uma combinação. Podem-se classificar, então, em atos predominantemente discricionários e predominantemente vinculados

Natureza

Segundo Afonso Queiró o poder discricionário consiste “numa outorga de liberdade, feita pelo legislador à Administração, numa intencional concessão do poder de escolha, ante a qual se legitimam, como igualmente legais, igualmente corretas de lege data, todas as decisões que couberem dentro da série, mais ou menos ampla, daquelas entre as quais a liberdade de acção administrativa foi pelo legislador confinada”

Porém esta decisão é ainda orientada pelos princípios e regras gerais que vinculam a Administração (Igualdade, proporcionalidade e imparcialidade), obrigando à procura e escolha da melhor solução para o interesse público.

Assim, como diz Vieira de Andrade, “a discricionariedade não é uma liberdade(...), mas sim uma competência (...) que corresponde a uma função jurídica”

Fundamento

O fundamento, em termos de causa jurídica é o próprio bloco de legalidade (Marcelo Rebelo de Sousa)

Seria impossível que tudo estivesse pormenorizadamente regulado pela lei, sem ser deixada nenhuma margem de discricionariedade.
Para além desta impossibilidade, este poder visa assegurar o tratamento equitativo dos casos individuais.

A discricionariedade fundamenta-se ainda no principio da separação dos poderes e na ideia de Estado Social de Direito, que não abdica de margem de autonomia jurídica.




Significado

O poder discricionário constitui um poder derivado da lei, só existe quando a lei o configura, só pode ser exercido por aqueles a quem a lei o atribui e é controlável jurisdicionalmente.

Sendo assim, segundo o professor Freitas do Amaral, o poder discricionário não é uma exceção ao principio da legalidade, mas sim uma das formas de subordinação da Administração à lei.

O professor Marcelo Rebelo de Sousa descreve a discricionariedade como uma afirmação do principio da legalidade, visto o bloco de legalidade poder vincular em absoluto a conduta administrativa ou então deixar zonas de livre escolha.

Evolução Histórica

A evolução desta realidade caracterizou-se pela progressiva subordinação deste poder a limites legais e ao controlo jurisdicional.

Numa primeira fase, do Estado de policia, o poder administrativo era completamente discricionário, havia uma ilimitação jurídica do poder politico do Estado.

Com o estado liberal surge a legalidade como limite exterior à atividade administrativa, sendo a discricionariedade ainda muito ampla, a Administração tinha a liberdade de fazer tudo o que a lei não proíba.

É então que se faz uma distinção entre administração pura e contenciosa, esta implicava o respeito pelos direitos patrimoniais dos particulares e que estava sujeita ao controlo pelos tribunais.

O artigo 280º do Código Administrativo de Costa Cabral em 1842 foi o primeiro passo, entre nós, para este sistema. O regulamento do Conselho de Estado de 1850 e o código administrativo de 1896 foram também passos em frente para a limitação legal do poder discricionário.

Um diploma publicado em 1930 vem esclarecer a expressão “excesso de poder” como o “exercício de faculdades discricionárias fora do seu objetivo e fim”.

A constituição de 1976 vem afirmar esta subordinação ao exigir a conformidade com as diretrizes de vários princípios gerais.

Tem se assistido nas ultimas décadas a uma importante alteração de perspetiva. A discricionariedade deixa de ser a liberdade de atuar sempre que a lei não o proibir, para passar a ser a liberdade de escolher só quando e na medida em que a lei o permita.




Âmbito

Aspetos que podem ser discricionários
a)    Momento da prática de um ato
b)    Decisão de praticar ou não um certo ato
c)     Determinação dos factos e interesses relevantes para a decisão
d)    Determinação do conteúdo concreto da decisão a tomar
e)    Forma a adotar para o ato administrativo
f)     Formalidades a observar na preparação ou pratica do ato
g)    Fundamentação ou não da decisão
h)    A faculdade de apor, ou não, no ato administrativo condições, termos, modos e outras cláusulas acessórias

Limites
1.     Limites legais - Aqueles que resultam da própria lei
2.     Limites que decorrem da Auto vinculação – a Administração pode exercer os seus poderes de discricionariedade de duas maneiras:
a.     Caso a caso
b.     Elaborando normas genéricas com critérios para apreciação de casos, com base numa previsão do que poderá vir a acontecer ou com base na experiencia



Controlo do exercício do poder discricionário
A atividade da Administração pode estar sujeita a vários tipos de controlo
·      Controlos de legalidade - determinam se a Administração respeitou ou violou a lei
·      Controlos de mérito – avaliam o fundamento das decisões administrativas, independentemente da sua legalidade
·      Controlos jurisdicionais – através dos tribunais
·      Controlos administrativos – pelos órgãos da administração

O controlo de legalidade em principio tanto pode ser feito pelos tribunais como pela própria Administração, mas em ultima análise compete aos tribunais, por outro lado, o controlo de mérito só pode ser feito pela Administração.

Dentro do mérito administrativo inserem-se duas ideias, a ideia de justiça (harmonia entre o interesse publico prosseguido e os direitos subjetivos e interesses dos particulares) e a ideia de conveniência (adequação ao interesse publico especifico)

A verificação da justiça, entretanto passou para o campo da legalidade, visto que o artigo 266º da CRP proclama o principio da justiça como um principio geral de direito.

Na prática, o controlo sobre o poder discricionário funciona da seguinte maneira, os poderes vinculados exercidos contra a lei são objeto do controlo de legalidade e os poderes discricionários exercidos inconvenientemente são objeto de controlos de mérito.

Os atos discricionários podem ser atacados contenciosamente com base em qualquer dos vícios do ato administrativo, a incompetência, o vício de forma, a violação da lei e quaisquer vícios da vontade.


Fronteiras da discricionariedade
A discricionariedade por vezes é aproximada de outras realidades jurídicas: a aplicação de regras de direito que remetem para regras extrajurídicas; a interpretação e aplicação de conceitos indeterminados ou vagos; a liberdade probatória; a interpretação e aplicação de regras que supõem a utilização de pautas normativas não jurídicas; a formulação de juízos de justiça material

O professor Diogo Freitas do Amaral agrupa as duas primeiras nas figuras afins e as três ultimas na discricionariedade imprópria. As figuras afins não são discricionariedade, nem estão submetidas ao regime, as discricionariedades impróprias não implicam verdadeira discricionariedade, mas estão sujeitas ao regime desta.

Para o Professor Marcelo Rebelo de Sousa nenhuma constitui discricionariedade por não haver liberdade de escolha.






Bibliografia

FREITAS DO AMARAL, Diogo. Curso de Direito Administrativo, Vol. II, 6º reimpressão da edição de 2001

REBELO DE SOUSA, Marcelo. Lições de Direito Administrativo, vol. I

QUEIRÓ, Afonso. Os limites do poder discricionário das autoridades administrativas, Coimbra, 1966

VIEIRA DE ANDRADE. O Ordenamento jurídico Administrativo




Catarina Vilhena Mina
subturma 14
56687


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