Sunday, November 5, 2017

Confronto entre os sistemas de tipo britânico e de tipo francês



Caracterização do sistema


  • Anglo-saxónico

Consagra a separação de poderes e o Estado de direito, tem uma organização administrativa descentralizada. O controlo jurisdicional da Administração era feito, exclusivamente, pelos tribunais comuns, existindo uma unidade de jurisdição. A execução das decisões administrativas depende de sentenças dos tribunais, estes ainda podem impor à administração a sua decisão para proteger as garantias dos particulares. A administração está subordinada ao poder judicial como os cidadãos. Com o desenvolvimento das tarefas desempenhadas pelo estado, o sistema britânico, começou a deixar de depender exclusivamente do direito comum e foi criando o seu direito administrativo, que nos é revelado através das “agencies” (entidades reguladoras de actividades- ex: D.E.A, C.I.A, A.T.F etc.) que obtiveram autotutela executiva, dada pelo poder legislativo, através do principio da legalidade. Também foram criados “Administrative Tribunals “, que visam resolver conflitos entre privados e a Administração ou apenas entre privados em matérias que a Administração tenha legislado o conteúdo dessas relações, também se criaram seções de direito administrativo nos “courts” (tribunais comuns).


  •  Francês

Consagra a separação de poderes e o Estado de direito, mas tem uma organização administrativa centralizada, o controlo jurisdicional da Administração era feita pelos tribunais Administrativos. A criação de tribunais administrativos deve-se a desconfiança que a Administração tinha em relação aos tribunais comuns, que podiam contrariar as suas decisões mais facilmente, então o direito regulador começa por ser controlado pela Administração e mais tarde judicializa-se, ou seja deixam de ser funcionários administrativos a julgar os atos da mesma e passam a ser juízes sem influências administrativas. Actualmente há dualidade de jurisdição; a Administração pode ser submetida a direito comum e ao administrativo. Aplica-se principalmente direito público, mas por vezes recorre-se ao direito privado para resolver questões relativas a Administração; o direito Administrativo pode julgar e fiscaliza-la, desde que não comprometa a separação de poderes nem a discricionariedade da mesma. (Esta separação da Administração que executava e fiscalizava as suas actividades, foi imposta pelas populações, que anteriormente eram vistas como um objecto inferior à Administração que facilmente podia alterar as suas esferas jurídicas, e mais tarde pela própria União Europeia). A execução das decisões administrativas não depende de sentenças dos tribunais, mas da administração, estes só as poderão julgar e fiscalizar posteriormente, podendo condenar a Administração a indemnizar mas não a cumprir um dever ou abster-se dum acto contrário à lei.

DICEY & HAURIOU

Dicey- 1885 Rule of law vs droit administratif

Na visão deste autor, são sistemas completamente distintos e incompatíveis, porque o Rule of Law vê cidadãos e Administração como iguais perante a lei, julgando a Administração com recurso ao direito comum e nos tribunais comuns; ao passo que o droit administratif, ao criar um ramo de direito e tribunais especiais para julgar a Administração só procura beneficia-la. Diz que qualquer funcionário da administração que cometa uma ilegalidade, no sistema francês, será julgado pelo droit administratif (doravante DAF) que decidirá quais os direitos do lesado e a forma como estes serão reconhecidos. O DAF procura assim dar direitos especiais e privilégios não só a administração mas também aos seus funcionários, regendo-os de acordo com os princípios diferentes daqueles usados para regular as relações entre privados. Dicey critica a suposta separação dos poderes judicial e administrativo em França, porque os funcionários dos tribunais administrativos julgavam sempre o intuito de proteger o governo e a administração, não sendo imparciais. Dicey refere também que a dualidade de jurisdição leva a que existam conflitos jurisdicionais entre os tribunais comuns e os administrativos (a tarefa de decidir quando aplicar direito administrativo pertencia ao Conseil d’état e mais tarde ao Tribunal Des Conflits). Dicey afirma que o DAF procura que os seus funcionários não sejam julgados pelo direito comum, mesmo que tenham cometido um ilegalidade, desde que tenha sido feita no cumprimento de ordens dos superiores hierárquicos. Dicey acreditava que o direito administrativo não seria passível de ser replicado na ordem jurídica do reino unido, pois era contrário ao Estado de direito, e não protegia os cidadãos dos abusos do poder administrativo.
Hauriou- 20 anos mais tarde- Administração judiciária vs Administração executiva
Afirma que todos os Estados têm funções administrativas, ou seja a promoção da satisfação das necessidades de ordem pública, assegurar serviços que visam satisfazer os interesses gerais e gerir assuntos de utilidade pública, no entanto alguns desses estados não têm um regime administrativo.
Dá Inglaterra como exemplo dum sistema sem regime administrativo, que assume funções administrativas e que confia no controle do poder judiciário comum, colocando a Administração e os particulares ao mesmo nível. Caracteriza este sistema como pouco centralizado, e afirma que não faz a necessária distinção entre direito comum e administrativo, o que pode gerar injustiças.
Dando como exemplo dum sistema com regime administrativo França, Hauriou demonstra que é um sistema fortemente centralizado. Caracteriza-o como um regime em que são desempenhadas funções administrativas, no entanto a fiscalização destes actos cabe ao direito administrativo. A administração desempenha as suas funções características e funções fiscalizadoras da sua jurisdição. É o poder executivo o responsável pela fiscalização da Administração, não o poder judicial como em Inglaterra. A criação dum direito especial deve-se à desconfiança da administração em relação ao poder judicial. Assim os agentes administrativos estão sob a alçada dos seus superiores hierárquicos, e são regidos por leis e regulamentos específicos da Administração. As autoridades agem por decisão executiva sem necessitarem de aprovação prévia do poder judicial.
Neste sistema os cidadãos não podem recorrer à justiça comum para restringir o cumprimento dos serviços por parte dos funcionários administrativos, estes estão cobertos por garantias administrativas. O sistema prevê a dualidade de jurisdições, que estão constitucionalmente separadas (existem leis comuns e leis administrativas). Para regular conflitos entre autoridades existe o Tribunal des Conflits, e se os cidadãos tiverem algum conflito com a Administração, é ao abrigo do poder administrativo e da sua interpretação das leis que o caso se resolverá.
Observações de Hauriou:
-O regime administrativo tem centralizadas as funções administrativas, estão sob a alçada jurídica do poder executivo. Há uma separação do poder executivo e do judiciário no que toca a administração do direito.
- A separação do direito comum e do administrativo é histórica e transversal aos países de regime administrativo. Anteriormente também tinham uma administração judiciária comparável á existente em Inglaterra , mas a evolução e a diferenciação dos poderes levou a esta mudança.
- Estes dois sistemas (administrativo e judicial) não são únicos, outros países adoptaram e combinaram características de cada um deles de modo a conseguirem obter o melhor dos dois.

O que reter de positivo deste debate?

-Dicey apercebeu-se das diferenças entre os regimes, estava certo ao afirmar que na época os tribunais administrativos não eram realmente tribunais mas sim órgãos da Administração que surgiram da vontade de decidir casos de contencioso administrativo de forma favorável á administração, o que poderia não acontecer no direito comum. Caracterizou o sistema francês pela subordinação da Administração aos tribunais próprios.
-Hauriou percebeu que a espécie distinguia os sistemas, não o género. Os dois submetem a administração ao direito: o comum, em Inglaterra, ou o administrativo, em França. Fez a distinção baseando-se em vários elementos de cada regime.
Criticas
-Dicey reduz a questão á existência ou não de tribunais administrativos, confundindo direito substantivo e organização judiciária; nem todo o direito administrativo passa pelos tribunais administrativos, os tribunais comuns têm algumas  competências nestas matérias; os tribunais administrativos por vezes aplicam direito privado (habitualmente usado nos tribunais comuns) à Administração. Afirmou que os tribunais administrativos não garantiam a protecção dos particulares face aos abusos da Administração, no entanto o Conseil d’ état já cumpria essa função. Em Inglaterra também existiam leis que davam bastante autoridade a órgãos administrativos, o que demonstra o despontar do direito administrativo onde Dicey diz que não teria adesão.
Hauriou demonstrou a evolução histórica do direito administrativo em França e nos demais países continentais, no entanto não previu que também se desse no outro lado do canal da Mancha.

Doutrina actual:

A maioria concebe o sistema judicial como o que concedia menos prerrogativas e poderes à Administração, tal como o que dá menos garantias e meios de defesa aos cidadãos; e o sistema francês como o que concedia mais poderes de intervenção à Administração mas também concedia mais garantias aos particulares. Por outro lado, parte da doutrina defende que a Administração britânica é tão intervencionista quanto a gaulesa, e que os seus tribunais comuns intervêm ainda mais, no controlo jurisdicional da acção administrativa, explicam o seu raciocínio com recurso à falta de capacidade dos tribunais administrativos Franceses para condenar a Administração a fazer/ não fazer algum ato, o que não acontece em Inglaterra e consegue proteger melhor os particulares e o respeito pela legalidade.
 

Bibliografia:
Hauriou, Le Droit Administratif
Dicey, Introduction to the study os the Law of the Constitution
Freitas do Amaral, Curso de direito administrative

Webgrafia:
Revista de direito do estado
www.atf.gov/

Tiago A. F. R. J. Rodrigues 
57337





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