Na passada madrugada do dia 1 de novembro, ocorreu um incidente
junto ao recinto do K urban beach, no qual os seguranças do respetivo local agrediram
violentamente dois jovens que nada fizeram para justificar tais atos de
violência, despoletando, consequentemente, vários problemas jurídicos sendo o
principal da minha análise o encerramento do espaço noturno por parte do
ministério da administração interna, por um período que pode ir até seis meses.
O encerramento teve como fundamento, não só o ato de violência acima referido,
mas também outras 38 queixas de violência e discriminação, feitas pelos frequentadores
do espaço. Dito isto, os problemas que caberão na minha análise são: a
diferença entre direito público e privado, a atuação da administração pública,
e a respetiva competência e por ultimo uma apreciação geral.
Em primeiro, importa definir se
estamos perante uma situação de direito público ou direito privado. À primeira
vista, a situação acima referida, afigura-se exclusivamente ao direito privado,
visto que os protagonistas são dois privados (critério do sujeito), e na verdade
tem um grande componente, como por exemplo a questão da responsabilidade civil
entre outras, mas será que vai para além do direito privado e passa para a
esfera do direito público?
No caso em concreto, é determinante definirmos se o interesse
por detrás da situação será exclusivamente privado? A resposta é, claramente,
que não, com base no artigo 4º do CPA, para além do interesse dos agredidos, existem
vários interesses da ordem pública legalmente protegidos, como por exemplo, o
de segurança para quem frequenta a vida noturna de lisboa, estabilidade social,
a discriminação entre outros, e compete aos órgãos da administração pública
atuar. A discoteca já esteve alegadamente envolvida em inúmeras situações como
esta, não tomando nenhuma medida para combater estes abusos, surgindo constantes
reincidências, até ao ponto gravoso que se constatou no vídeo, causando um enorme
impacto social.
Ainda neste tema pode surgir a questão de saber se podemos
considerar o encerramento do espaço noturno um verdadeiro interesse social, tendo
em conta o numero reduzido de pessoas que frequentam esses espaços, mas também
isto é de resposta fácil pois não há um numero mínimo de pessoas exigível para
se considerar interesse geral da sociedade, há interesses que abrangem mais
pessoas e outros menos pessoas, mas não deixam de ser gerais, e neste caso é
claramente um interesse social, pois está aqui em causa a segurança da
comunidade que é afetada direta ou indiretamente, e mesmo a própria reputação
da cidade tendo em conta que também houve vários turistas vitimas dos abusos,
podendo assim vir a afetar o turismo.
Em suma, através do princípio do fim, aparentemente, podemos
concluir que isto é um problema de ordem pública mas existem outros critérios
que devem ser analisados porque este apesar de útil é muito vago, por isso
passaremos a análise do princípio da legalidade.
Este princípio tem um enorme relevo nestas situações sendo
considerado por muitos professores o critério determinante, eu próprio assim o considero.
Os privados gozam de liberdade contratual e é permitido a busca de um interesse
particular enquanto o direito público tem o seu poder concentrado na lei, ou
seja, com base no artigo 3º do CPA, o poder público apenas pode atuar quando
existir uma lei que o permita. É imposta à administração pública um interesse
publico mas esta não tem a autonomia para decidir qual é esse interesse, quem
tem essa função é o poder legislativo, e a administração não pode ir para além
disso. No fundo este critério engloba o outro, pois é na lei que se pode
encontrar o verdadeiro interesse publico.
Voltando ao caso em análise, quem encerrou a discoteca foi o
ministério da administração interna, e já concluímos que era um interesse geral,
mas como foi referido anteriormente, para uma análise mais eficaz, é uma norma que
define se o MAI tinha atribuição para tal, que no fundo é o fim que o órgão
(ministro da administração interna) tem que seguir. Ao analisar o decreto-lei
126-B/2012, cabe ao ministério da administração interna “a formulação,
coordenação, execução e avaliação das políticas de segurança interna” e com
base no artigo segundo alínea c) e f) podemos concluir que o ministério público
tem atribuições para tomar medidas nas situações que ponham em causa a
segurança prevenindo estes atos.
A próxima fase
é encontrar uma norma de competência ou um princípio para a forma de como a
administração deve atuar e as devidas sanções a aplicar. Para o caso em
concreto há uma norma que é invocada ao agir. O MAI encerrou o K urban beach ao
abrigo do decreto-lei 316/95 artigo 48 que dá competência para atuar e define
com extrema clareza as medidas a tomar em casos de violação da ordem ou da
tranquilidade pública, situações que se constataram na madrugada de quarta-feira,
devendo o direito publico atuar com autoridade, sobrepondo o interesse publico
ao interesse privado (principio da supremacia do interesse publico).
Ao analisar o
artigo 48 do Decreto-lei acima referido, averiguamos que foram respeitadas
todas as exigências do número 1 e do número 2 do artigo pois o despacho
declarava o encerramento e as respetivas indicação dos condicionamentos a
satisfazer para reabertura do espaço.
A minha análise
ao caso é que houve certamente uma violação clara de direitos fundamentais
estabelecidos na CRP pondo em causa a segurança pública e apesar da discoteca
se tentar legitimar nestas acusações também é uma parte importante e
responsável. Mesmo que os delitos não ocorram nas instalações da discoteca, os
seguranças prestavam serviços à discoteca e quando a policia chegou refugiaram-se
no interior da mesma, para piorar a situação existem mais 38 queixas de
violência e discriminação que foram feitas que fundamentam esta acusação, e todo
este conjunto, obriga a administração a tomar medidas de prevenção de atos
futuros deste cariz visto que a discoteca neste período nada fez, e se não forem
tomadas medidas por parte da administração estas condutas continuarão a ser
frequente, como tem acontecido, podendo a própria administração vir a ser
responsabilizada visto que não tomou as medidas que lhe competiam numa situação
em que não se estava a respeitar as licenças atribuídas, o que gera um outro
problema que será abordado mais a frente. A empresa de segurança (PSG) também
terá de ser fiscalizada por parte da administração publica, pelas mesmas razões,
com objetivo de garantir o mesmo fim da situação anterior, mas cabe, exclusivamente,
ao direito publico a fiscalização para garantir este cumprimento que
refletir-se-á numa maior segurança publica a todos os níveis.
Mas esta é uma
situação muito sensível que merece um cuidado redobrado para que não se volte a
repetir, não apenas com a discoteca, mas também com a PSG, empresa contratada
para garantir a segurança, em ambas as situações existem licenças atribuídas
pela administração publica autorizando o funcionamento das empresas nas
respetivas atividades pois cumpriram todos os requisitos exigidos para que a
licença seja atribuída, e mesmo que, durante o encerramento do K urban beach,
esses requisitos sejam novamente cumpridos e o local seja reaberto, há que
manter um acompanhamento mais sólido, para que situações destas nem sequer
tenham margem para acontecer e não seja necessário chegar outra vez a um ponto
tão extremo para ter que tomar medidas devido às empresas deixarem de respeitar
a lei, dito isto, situações como estas, exigem uma fiscalização constante e
apertada por parte dos serviços competentes que, com base no artigo 50 do
Decreto-lei 316-95, são a PSP e a GNR, são considerados serviços do órgão, pois
ajudam o órgão a chegar aos seus objetivo visto que é impossível a todos os
níveis fazê-lo por si só.
Importa aqui
salientar que estas empresas, como já foi referido anteriormente, funcionam ao
abrigo das licenças que lhes são atribuídas pelos poderes públicos certificando
que cumprem todos os requisitos necessários para que haja um funcionamento do
estabelecimento sem qualquer problema nem prejuízo para a população. Dito isto
até se pode por a questão de saber até que ponto a própria administração
pública não é responsável perante esta situação.
A licença
serve como um meio de controlo administrativo de atividades privadas, ao preencher
todos os requisitos legais para que a licença possa ser emitida a administração
fica com o dever de o fazer atribuindo um direito que até ai era proibido pela
lei. Se o processo da emissão da licença respeitar todas os requisitos, a
administração publica não ficará responsável por qualquer ato daí resultante porque
cumpriu todas as obrigações, sendo depois o seu único dever a fiscalização para
manter a segurança visto que nada garante que a empresa continua a respeitar as
regras, e se esta for feita em condições, também não se pode responsabilizar
por qualquer infração dai resultante, por exemplo, uma pessoa obtém a licença
de condução pois mostrou-se apto para tal, mas nada garante que durante o
período de validade da licença respeite sempre as regras do código da estrada e
é para isso que existe a fiscalização por parte das entidades competentes. E se
o singular se mostrar infrator ser-lhe-á retirada a licença temporariamente ou,
em casos extremos, definitivamente, com o objetivo de melhorar a segurança dos
outros condutores. Por isso, chegamos à conclusão que a administração não é
responsável por qualquer atos realizados, supondo que foram tomadas todas as
precauções na entrega da licença e depois feita uma fiscalização devida às empresas
aqui em causa, ficando com o dever de tomar as respetivas medidas.
Mas claramente
não será justo, e, a meu ver, vai contra o princípio de proporcionalidade
(artigo 7º do CPA), cessar por completo as licenças de utilização. Estamos perante
empresas de grande dimensão com um numero elevado de funcionários e não será
correto tomar tal decisão com base apenas no comportamento de três seguranças,
é imperativo que se dê oportunidade a uma restruturação da segurança e de
medidas para que as empresas voltem a funcionar dentro dos limites das leis, e
não à margem da mesma, como se tem observado. As medidas a serem tomadas serão
estipuladas pela PSP e depois de estas estarem todas verificadas e voltarem a
cumprir as exigências das licenças poderão ter as respetivas licenças de volta,
reabrindo o espaço (Artigo 48 nº2).
Cristian
Ghitu, 56856